Ambientalistas temem uso de tecnologia ultrapassada no setor automotivo no país

05/09/2017 08:14 - Valor Econômico

A legislação brasileira que estabelece eficiência e menor emissão de poluentes de automóveis, caminhões e ônibus é atrasada. O temor de pesquisadores ligados a ambiente e saúde com as decisões do Rota 2030 é que as montadoras vendam ao Brasil tecnologia antiga, movida a combustível fóssil, enquanto investem na eletrificação de carros na Europa e nos EUA. O plano é para o futuro, mas seria uma aposta no passado.

"Outros países estão aumentando padrões e o Brasil está ficando para trás", diz Cristiano Façanha, líder de projetos do International Council on Clean Transportation (ICCT), organização baseada em Washington que tem por objetivo mitigar mudança climática e poluição estimulando políticas de transporte limpo. Em 2013 a ONG atuou nos testes de emissões de carros a diesel da Volkswagen. Foi o começo do escândalo da fraude.

"Os EUA, a China, a Índia, o Japão e a Europa têm metas e padrões mais altos de eficiência que o Brasil. Essas metas não beneficiam somente a redução de emissões, mas também o consumidor, a indústria - pela inovação tecnológica - e a economia, porque o veículo se torna mais competitivo no mercado internacional", continua.

Uma análise do ICCT sobre custos e benefícios de os veículos leves no Brasil atingirem os mesmos níveis de eficiência dos europeus mostra que, com metas agressivas, o Brasil poderia se equiparar ao mercado europeu, em eficiência, até 2023, e ganharia em inovação. "Tem que investir em tecnologia, mas o custo inicial é compensado no tempo", continua.

Já o estabelecimento de metas de eficiência para veículos pesados é um processo complexo, reconhece Façanha. "A maneira efetiva de o Brasil começar é pelo motor. Isso já acontece nos EUA, Canadá e Japão, e é um primeiro passo", continua.

O Brasil não permite venda de carros leves movidos a diesel. Mas as SUVs, que consomem mais que os veículos menores e são piores para a eficiência veicular, se aproveitam de uma brecha da legislação para ser classificadas como "comerciais leves" e assim, rodar com diesel. "Elas poluem mais. Por isso, qualquer meta de eficiência energética proposta pelo Ministério tem que ser rigorosa, especialmente para as SUVs", continua Façanha.

O passo que o Brasil deveria dar, defendem pesquisadores, seria estimular os carros elétricos e híbridos e favorecer também os movidos a etanol. Um estudo publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences (Pnas) comparou as emissões de carros a combustão com veículos elétricos na China e nos EUA. Na China, como a matriz energética é ainda baseada em carvão, o total de emissões de um carro elétrico (considerando a fonte de energia suja) é alto, e nos EUA, dependendo da região, também. Não seria o caso do Brasil, com uma das matrizes elétricas mais limpas do mundo. Aqui carros elétricos trazem grandes vantagens ambientais em relação à gasolina e também ao etanol. "Carros elétricos têm emissão zero de escapamento e seriam ótima opção às áreas urbanas, onde mora a maioria da população", diz Façanha.

Alfredo Sirkis, secretário-executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, diz que não há transparência nos debates do Rota 2030. "O novo regime automotivo do Brasil está sendo discutido pelo ministério e pela Anfavea. Não se considera a meta brasileira de reduções de emissões", diz Sirkis.

"Esses parâmetros podem significar que o Brasil se torne recebedor de fábricas de combustíveis fósseis que forem desativadas no Primeiro Mundo", diz Gustavo Pinheiro, coordenador de política climática do Instituto Clima e Sociedade. "Com estes parâmetros há o risco de as montadoras deixarem no Brasil as fábricas que desativaram lá fora, para produzirmos veículos a gasolina ", segue Pinheiro