A Polícia Civil de São Paulo investiga a ação de criminosos
que, além de abusar e assediar mulheres no transporte público, filmam,
fotografam e divulgam imagens na internet. Neste ano, 17 suspeitos de abuso
foram presos pela Polícia Civil. Nesta semana, dois foram detidos na
quarta-feira (19), sendo que um deles tinha uma câmera com vídeos de mulheres
feitos no Metrô. Os dois foram indiciados por importunação ofensiva ao pudor.
Na segunda-feira (17), outro foi preso em flagrante e indiciado por tentativa
de estupro.
O fenômeno, conhecido como "frotteurismo” (ato de
esfregar-se em outra pessoa) foi traduzido nas comunidades investigadas pelos
termos "encoxadas” e "encoxadores”.
Para praticar o crime, homens usam telefones celulares,
máquinas fotográficas e até micro-câmeras escondidas para registrar o abuso
contra as vítimas dentro de ônibus, e dos vagões e plataformas do Metrô e trens
lotados. O objetivo é encostar ou exibir o órgão sexual masculino no corpo
feminino, principalmente nádegas e seios.
Quando não tocam as vítimas, eles flagram calcinhas embaixo
das saias e closes de decotes. As cenas vão parar no Facebook, no Youtube,
blogs e até em trocas de mensagens pelo aplicativo WhatsApp. Apenas uma das
cerca de 40 páginas relacionadas ao tema no Facebook chegou a ter mais de 12
mil seguidores.
Os autores das imagens e relatos evitam se mostrar. Eles
usam pseudônimos para continuarem a prática criminosa sem serem descobertos. Na
quarta-feira (19), no entanto, dois homens foram presos em flagrante suspeitos
de abusar de mulheres no Metrô. Eles foram detidos na estação Sé, no Centro da
capital paulista. Segundo policiais civis, um técnico de informática de 26 anos
filmava com o celular partes íntimas das mulheres para publicar nas redes
sociais. Já o outro homem preso, um engenheiro elétrico, passou a mão em uma
das passageiras. Os dois foram liberados para responderem em liberdade.
Na última segunda, um universitário desempregado foi preso
em flagrante por suspeita de abusar sexualmente de uma passageira dentro de um
trem da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).
Ele foi acusado de agarrar a mulher, tentar arrancar sua
calça e ejacular nela. A vítima gritou e os outros passageiros espancaram o
agressor. Detido, foi levado para a Delegacia do Metropolitano (Delpom), na
estação Barra Funda, Zona Oeste. Segundo policiais, ele ainda estaria preso.
Influenciado por
sites
De acordo com o delegado Osvaldo Nico Gonçalves,
divisionário da Divisão Especial de Atendimento ao Turista (Deatur),
responsável pela Delpom, o estudante de administração alegou que foi
influenciado por páginas que acessou na internet que estimulam ataques a
mulheres dentro da rede de transportes. "Tem muitas páginas que incentivam
esse tipo de ato. Estamos rastreando quem publica as imagens para tentar
prendê-los".
Tem muitas páginas que incentivam esse tipo de ato. Estamos
rastreando quem publica as imagens para tentar prendê-los."
Segundo o delegado, o homem preso tem 24 anos e confessou o crime.
"Ele disse que estava muito apertado no trem e não aguentou e fez o que fez”.
O G1 não conseguiu localizar os três suspeitos detidos para
comentar o assunto.
Segundo Nico Gonçalves, outros 16 casos semelhantes foram
levados este ano à Delpom, que investiga crimes no Metrô e CPTM. Eles foram
registrados como importunação ofensiva e atos obscenos. Dados da Secretaria da
Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP) mostram que em 2012 foram
registradas nesta delegacia duas ocorrências de estupro e no ano passado, três.
Além do crime de estupro, os "encoxadores” podem responder,
dependendo do caso, por abuso sexual, atentado violento ao pudor, assédio
sexual, uso indevido da imagem, constrangimento ilegal e pedofilia.
Em 2013, cem mulheres fizeram denúncias após serem vítimas
de agressões sexuais em ônibus, metrô e trens na cidade de São Paulo. Além dos
três casos da Delpom, há registro na Secretaria Municipal de Transportes
(SPTrans) de"97 "reclamações de mulheres relacionadas a tentativas ou
prática de abuso ou assédio dentro de ônibus”.
De acordo com seguranças do Metrô e da CPTM ouvidos pela
equipe de reportagem, todos os dias eles recebem denúncias e relatos de
assédios sexuais sofridos por passageiras. "Além de celulares apreendidos com
fotos e vídeos de mulheres, já pegamos esses ‘encoxadores’ com câmeras
escondidas em sapatos, canetas”, disse um segurança ao G1, que só aceitou falar
sob a condição de que seu nome não fosse divulgado.
Vítimas
A analista Evelin Ribeiro de Souza Pinheiro, de 24 anos, e a
amiga Patrícia Lopes, uma supervisora de 26 anos, afirmaram que já foram vítimas
dos ‘encoxadores’ no Metrô.
"Já fui vítima de assédio e abuso sexuais dez vezes. Eu
reclamava, mas desisti depois da indiferença dos funcionários do Metrô”, diz
Evelin. "Quando fui procurá-los para relatar o que ocorreu, me aconselharam a
desistir da queixa e procurar uma companhia para andar dentro do vagão ou que
alguém fosse me buscar no Metrô”.
Patrícia comentou que apesar de ter sofrido três ataques no
Metrô e na CPTM, só um dos casos virou boletim de ocorrência. "É que nas outras
duas vezes os homens fugiram”, disse ela. "Em 2010, dentro de um trem senti uma
pressão no meu ombro. Quando vi era um homem com o pênis para fora. Pensei em
pedir ajuda, mas ele estava com amigos que pediram para eu ficar quieta e
fiquei com medo”.
Em 2006, um homem que fotografava Patrícia com o celular foi
preso após ela pedir ajuda à segurança do Metrô. "Era sempre o mesmo cara. Ele
me perseguia, sabia meus horários. Um dia ele fingia que mexia no celular, mas
estava me fotografando, tentando me filmar”, lembrou. "Desci na plataforma da
Sé e um grupo de seguranças o pegou”.
Outras mulheres ouvidas pela equipe de reportagem comentaram
que, além de empurrarem o agressor e gritarem, usam alfinetes para espetar os
"encoxadores” e se protegerem deles.
No ano passado, o vereador Alfredinho (PT) chegou a lançar o projeto de vagões
exclusivos para mulheres no Metrô e trens, mas retirou a ideia após reações
contrárias de grupos de mulheres. Segundo sua assessoria, ele estuda uma nova
proposta para garantir a segurança feminina no transporte público.
Especialista
Para o psiquiatra forense Guido Palomba, os "encoxadores”
são "psicopatas sexuais”. Na opinião do especialista, do ponto de vista
psiquiátrico, o melhor termo para defini-los é o "frotteurismo”. A palavra de
origem francesa, vem de "frotteur”, que significa "fricção” em português.
"O ‘frotteurismo’ é a mania sexual de se esfregar em vítimas
em lugares públicos sem o consentimento delas. Isso era até um tempo atrás mais
difícil de ver. Mas hoje, todo dia e qualquer hora, é encontrado em metrô, trem
e ônibus lotados”, analisou Palomba. "São compulsivos sexuais, psicopatas sexuais que sofrem de transtornos
mentais. Apresentam uma série de transtornos sexuais, entre esses é o de ficar
se esfregando na vítima”, avalia.
Nos Estados Unidos essa prática de homens se esfregarem em
mulheres também é conhecida, mas por "groping” (‘tateando’). No Japão, recebe o
nome de chikan (algo como ‘molestar’ ou ‘molestador’).
Sites denunciados
De acordo com a Safernet Brasil (organização da sociedade
civil sem fins lucrativos que atua na proteção e promoção dos direitos humanos
na internet), o "frotteurismo” na web é um fenômeno que vem sendo combatido no
país desde 2007.
"É um fenômeno que ganhou força há alguns anos”, disse ao G1
Thiago Tavares Nunes de Oliveira, presidente da SaferNet. "Levantamento feito por nós mostra que nos
últimos oito anos recebemos 2.090 denúncias de 21 páginas de ‘encoxadas’ no
transporte coletivo no Brasil”.
Nesse período, a SaferNet entrou em contato com os
provedores dos sites e conseguiu remover sete páginas. "Foram seis pelo Google
e uma pelo Facebook”, disse Nunes de Oliveira.
Metrô e CPTM
Questionados sobre os "encoxadores”, Metrô e CPTM informaram
que "repudiam qualquer atitude que caracterize assédio sexual.” "Para combater a ação de assediadores, a
usuária importunada deve informar o fato imediatamente a um funcionário,
apontando o autor e registrar queixa na Delegacia de Polícia”, informa trecho
da nota conjunta divulgada.
Em entrevista ao G1, o chefe da segurança do Metrô, Rubens
Cirilo Menezes, afirmou que os crimes sexuais correspondem a menos de 1% das
ocorrências registradas para 1 milhão de usuários. Por dia, são transportadas
mais de 4 milhões de pessoas.
"Apesar de serem crimes esporádicos em relação ao furto,
que é o que tem maior incidência, os crimes sexuais são combatidos por nós. Mas
além dos seguranças disfarçados, precisamos receber denúncias também das
vítimas, relatos de testemunhas para prender os suspeitos".
Metrô e CPTM mantêm o serviço de SMS-Denúncia, que garante anonimato do passageiro. Para isso, é necessário enviar um torpedo para os celulares: (11) 97333-2252 (Metrô) e (11) 9 7150-4949 (CPTM).”
Folha de SP
Dois são detidos sob suspeita de abuso sexual no metrô
Uma vítima diz ter sido agarrada e a outra teve as partes íntimas filmadas; suspeitos foram ouvidos e liberados
Dois homens foram detidos, ontem, sob suspeita de abusar de
passageiras na estação Sé do metrô, em São Paulo. Os crimes ocorreram durante o
período de maior movimento da manhã.
Uma vendedora de 33 anos, que pediu para não ser
identificada, contou que foi agarrada duas vezes por um técnico de informática
de 26 anos ao descer do vagão lotado.
"Senti ele passando a mão na parte de dentro da minha
coxa. Olhei para trás, ele deu um sorrisinho e depois fez de novo. Desci e
comecei a gritar", contou. "Ele apertou o passo. Eu fui atrás e
apontei, procurando um segurança."
O rapaz foi detido por seguranças do Metrô e encaminhado
para a Delpom (delegacia do Metrô), na estação Barra, onde negou o abuso.
O outro caso ocorreu quando uma auxiliar administrativa de
25 anos subia uma escada rolante da estação.
Ela foi abordada por um segurança, que flagrou um homem
usando o celular para fazer imagens das partes íntimas dela sob sua saia.
"Eu nem tinha percebido que tinha alguém me filmando.
Só soube quando o segurança me chamou. Foi muito constrangedor", contou a
mulher, que também pediu para não ter o nome divulgado.
No celular do rapaz, um engenheiro elétrico, havia imagens
da jovem e de outra mulher --ainda não identificada-- filmada da mesma maneira
dentro de um vagão.
Questionado, ele disse: "Faço para mim mesmo. É um
distúrbio da minha cabeça".
Os dois detidos assinaram termos circunstanciados (registro
de crime leve) e foram soltos --nenhum deles apresentou advogado.
Posteriormente, eles deverão ser chamados por um juiz e
poderão ser encaminhados para trabalhos voluntários.
Segundo o delegado Osvaldo Nico Gonçalves, 17 suspeitos de
crimes semelhantes foram detidos no último mês.
Apenas um foi indiciado por estupro, porque houve uso de
violência. Na segunda passada, um estudante de administração torceu o braço de
uma mulher e ejaculou na perna da vítima, na CPTM.