RIO - Em 1982, o governador Chagas Freitas inaugurava uma
Grajaú-Jacarepaguá novinha em folha. Considerada uma das principais realizações
do governo da época, a duplicação da autoestrada garantiria ao carioca
atravessar os 9 km em apenas oito minutos. Decorridos 31 anos, a impressão de
quem passa todos os dias pela via é que a Avenida Menezes Cortes (seu nome
oficial) parou no tempo quando o assunto é segurança e infraestrutura. Faltam
acostamentos nas pistas de descida, radares são insuficientes para controlar o
ímpeto dos motoristas, moradias — muitas delas irregulares — proliferam às
margens da via, e traficantes de drogas circulam pelo asfalto, onde trafegam em
média 47 mil veículos diariamente. As estatísticas mostram que andar por ali é
mesmo uma aventura: o número de acidentes subiu 41,5% de 2011 para 2012,
pulando de 94 para 133. No mesmo período, a quantidade de veículos na via subiu
7,6%. Somente de janeiro a julho deste ano, foram contabilizadas 61 ocorrências
envolvendo automóveis. Chama a atenção o número de capotamentos no período: 18,
ou 29,5%.
A pedido do GLOBO, o engenheiro Luiz Antônio Cosenza,
vice-presidente do Crea-RJ, fez uma avaliação da estrada na manhã da última
quarta-feira. Como medidas mais urgentes, ele sugere a redução de velocidade
nas pistas de descida dos atuais 60km para 50km e a instalação de recuos de
segurança. Atualmente, a estrada conta com quatro lombadas eletrônicas. Cosenza
observou ainda a necessidade de sinalização eletrônica, alertando para os
perigos principalmente em dias de chuva. Durante a inspeção, homens que circulavam
nas proximidades Morro da Cachoeira Grande, no Complexo do Lins, chegaram a
oferecer maconha e crack ao motorista de Cosenza.
— Na maior parte dos trechos de descida não há acostamento.
E há espaço para fazer esses recuos em alguns locais. Se um motorista enguiçar
com o carro, pode ficar em apuros. Assim como acontece na Ponte Rio-Niterói,
painéis luminosos poderiam indicar o perigo de se trafegar em alta velocidade.
Em dias de chuva, a prudência deve ser redobrada. São muitas curvas em 90
graus. Há abuso de velocidade, muitos não respeitam os pardais — afirmou o
engenheiro.
Estrada fecha em caso
de chuva forte
A região, que no século XIX abrigou uma fazenda de Antônio
Pereira de Sousa Barros, o barão do Engenho Novo, deixou o passado bucólico
definitivamente para trás. O perigo espreita quem mora a poucos metros da
pista. Caso do sergipano Israel Rodrigues, de 49 anos, morador do Morro do
Encontro, uma das comunidades que crescem à margem da estrada. Ele teve o carro
destruído na última segunda-feira por um motorista que perdeu o controle da
direção:
— O rapaz veio em alta velocidade, atravessou a pista e
atingiu em cheio o meu Gol, que estava estacionado na pista de subida. Por
poucos minutos meu filho não estava dentro do carro.
A advogada Lívia de Moura, de 28 anos, mora há dois anos em
Jacarepaguá e pega diariamente o ônibus da linha 306 (Castelo-Praça Seca) para
chegar ao trabalho, no Centro. Ela reclama da falta de opções de escoamento do
tráfego em caso de acidentes na serra e da escuridão em alguns trechos da
estrada.
— Qualquer acidente, mesmo uma simples batida, gera enorme
transtorno. E em alguns trechos, é comum não ter qualquer tipo de iluminação.
A CET-Rio informou, em nota, que refez toda a sinalização da
pista de descida, no sentido Jacarepaguá, em 2011. No mesmo ano, acrescentou o
órgão, foram feitas sinalização com setas em curvas perigosas, linhas de
aproximação de curvas e colocação de placas com telefone para atendimento de
usuários. Sobre a falta de apoio aos motoristas, a prefeitura garantiu que
rondas são realizadas 24h por dia e que a operação conta com controladores de
tráfego, reboques, picapes e motocicletas. Quanto às ações de vandalismo nas
placas de trânsito, a CET-Rio disse que vem realizando estudo com um material
específico que permitirá criar uma camada de proteção nas placas da cidade,
facilitando a remoção de pichações. A prefeitura não informou se há planos de
instalação de novos radares ou mudança do limite de velocidade na via.
Os deslizamentos de encostas são outro problema frequente da
Grajaú-Jacarepaguá. Em 2010, a GEO-Rio investiu R$ 12,4 milhões em
intervenções, com recursos do Ministério da Integração Nacional. No fim de
2011, mais R$ 3,1 milhões foram aplicados no desmonte de um bloco que se
desprendeu da encosta e na construção de uma parede de concreto na altura do
Morro da Cotia. Nos últimos três anos, a prefeitura informa ter feito
intervenções em outros 14 pontos sujeitos a deslizamentos. Mesmo assim, a via é
fechada sempre que chove forte.
O presidente da GEO-Rio, Márcio Machado, afirma que 98% das
favelas cariocas com casas em áreas consideradas de alto risco — caso de
comunidades que cortam a via expressa — já estão dotadas de sistemas de alerta
sonoro.
— Estamos finalizando a entrega de documentos para a Caixa
Econômica Federal, com o objetivo de conseguir a liberação de recursos federais
do PAC II. As novas intervenções preveem obras de infraestrutura no Complexo do
Lins e até, em alguns casos, o reassentamento de famílias — afirma.
O governo do estado, por sua vez, informou que está prevista
a construção de 800 moradias pelo programa Minha Casa, Minha Vida. Mas ainda
não há prazo definido para isso.
A falta de segurança talvez seja um dos maiores obstáculos
da Avenida Menezes Cortes. O histórico de violência não é recente. Há 11 anos,
o restaurante Cabana da Serra, ponto de referência na estrada, fechou as
portas. Sucumbiu ao medo dos frequentadores. José Octávio Ramalho Ortigão,
trineto do barão do Engenho Novo e ex-sócio do empreendimento, diz não ter planos
para reativá-lo. Atualmente, o terreno abriga um campo de futebol.
Uma das principais artérias da cidade, a Grajaú-Jacarepaguá
teve suas obras iniciadas em 1937, na gestão do prefeito Olímpio de Melo, mas a
inauguração só ocorreu 20 anos depois, com Negrão de Lima. De 1959 a 1982, os
motoristas tinham que vencer a Serra dos Pretos Forros em pistas de apenas uma
faixa de rolamento. Nas últimas três décadas, a quantidade de veículos na
autoestrada avançou 50%, passando de 30 mil para 47 mil. Inaugurada em 1997, a
Linha Amarela passou a absorver grande quantidade de motoristas que fazem o
deslocamento Centro-Jacarepaguá.