CIDE municipal: Lacerda quer taxar combustível para reduzir preço da passagem

18/03/2016 07:45 - O Tempo - MG


BERNARDO MIRANDA

O prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), quer criar um tributo municipal sobre combustíveis para subsidiar o preço das passagens de ônibus nas capitais brasileiras. Como presidente da Frente Nacional de Prefeitos, Lacerda trabalha para mobilizar parlamentares pela aprovação da PEC 179/2007, que tramita na Câmara dos Deputados e autoriza a criação da taxa. A medida seria o principal trunfo para reverter a queda no número de passageiros do transporte coletivo. Em Belo Horizonte, ela foi de 6,5% no ano passado, na comparação com 2014.

A justificativa da frente é que veículos particulares causam congestionamentos que, por sua vez, elevam o preço das passagens de ônibus. Conforme estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os automóveis utilizam 78% da malha viária das cidades, mas transportam apenas 33% da população que se desloca diariamente. O Ipea calcula que os congestionamentos aumentam o preço das passagens em 9,6%. Isso ocorre porque, com o trajeto da viagem mais demorado, os custos com combustível aumentam. Também será preciso, segundo o Ipea, mais ônibus e operadores para cumprir o quadro de horários.

Segundo a frente, a cada R$ 0,10 cobrados a mais no combustível, seria possível reduzir R$ 0,30 na passagem. Na prática, seria uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), porém revertida para os municípios, e não para a União. “Esse assunto será tratado na 69ª reunião da Frente Nacional de Prefeitos, na próxima semana, no Rio de Janeiro”, disse Lacerda.

O presidente da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Otávio Cunha, é a favor da medida. Ele destaca que as principais capitais do mundo subsidiam a passagem e explica que a proposta em tramitação dá liberdade para cada cidade decidir como irá implantar a tarifa.

“Cada cidade terá que avaliar qual será o impacto no preço da gasolina para alcançar a redução na passagem. Esse modelo permite, inclusive, que a população decida se prefere uma redução de R$ 0,30 na tarifa ou uma gasolina R$ 0,10 mais barata”, afirmou. Para Cunha, a saída para reverter a tendência de queda no transporte público passa, necessariamente, pelo subsídio, aliado à criação de faixas exclusivas de ônibus.

O consultor em transportes João Luiz Dias vê a criação de um novo tributo com ressalvas e defende que a Cide, já existente, seja aplicada como previsto. “Inicialmente, 25% do arrecadado com a Cide (nacional) iria para investimentos em transporte público. Mas hoje esse repasse é zero”, disse.

Mais sobre a PEC

O que é? A PEC 179/07 autoriza municípios a criar a Cide municipal, por meio de um projeto de lei complementar. Cada um definiria o impacto do tributo no preço de combustíveis e a redução alcançada.

Tramitação. A PEC já passou por comissões regulares e é analisada por uma grupo especial criado para analisar a proposta. Depois ela irá para plenário. Se aprovada, deve passar pelo Senado e ter sanção presidencial.

Ações. Enquanto a proposta não é aprovada, a BHTrans afirma que trabalha com renovação da frota, melhoria do sistema de informações e das faixas exclusivas de ônibus para aumentar o número de passageiros.

Prefeitos e empresas defendem queda da inflação após medida

Apesar da proposta de subsídio prever aumento no preço da gasolina, estudos da frente apontam que a medida não iria pressionar a inflação. Os prefeitos alegam que 36% do que é gasto com passagens de ônibus vem do pagamento de auxílio-transporte por empresas aos seus funcionários – são R$ 10 bilhões por ano no Brasil. Com a redução das passagens, reduziria também o custo dessas empresas.

“O aumento da passagem tem um peso maior no cálculo da inflação do que o da gasolina. Portanto, o subsídio poderia inclusive causar um efeito contrário, com a redução do preço de alguns produtos”, defende o presidente da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Osvaldo Cunha.

Desvio do recurso para lucro é temor

A maior preocupação com a criação de um tributo para subsidiar a passagem é se haverá, de fato, uma melhora no transporte público ou se ele servirá apenas para aumentar o lucro das empresas. O consultor em transportes João Luiz Dias afirma que a taxa sozinha não é solução para atrair passageiros.

“Sem uma gestão pública eficiente do serviço, isso será inútil. Hoje, quem define como serão os quadros de horários e toma todas as decisões sobre a gestão do sistema são as próprias empresas. Como o interesse delas é o maior lucro, e não a prestação de serviços, os passageiros são prejudicados”, pontua.

O analista destaca que não há como continuar incentivando o uso dos ônibus em grandes metrópoles. A única saída é a expansão do metrô.