Consciência contra as mortes no asfalto

19/06/2016 11:27 - Correio Braziliense / Zero Hora - RS / Expresso MT

Há exatos oito anos, a proibição de dirigir alcoolizado monopolizou as conversas de bar, os jantares em família e até as celebrações religiosas. Entrava em vigor a Lei Federal nº 11.705/08, com redução dos níveis de tolerância para aplicação de multa e para classificar como criminosa a conduta do infrator. De lá para cá, as autoridades de trânsito contabilizam a redução de 686 mortes, apesar do crescimento da frota e do número de condutores no período.

O saldo positivo, porém, não pode ser comemorado por uma parcela da população. Famílias e amigos continuam enterrando vítimas de pessoas que, mesmo alcoolizadas, decidem pegar o volante. Muitos deles, jovens recém-habilitados. O caso mais recente ocorreu há uma semana. O empresário Algmar Romualdo dos Santos, 43 anos, perdeu a vida em um acidente de trânsito, na madrugada de 13 de junho, na Avenida Elmo Serejo, em Taguatinga. Ele voltava do trabalho com a mulher, Mariza Ponssiano, 53, quando teve o veículo atingindo por outro, que invadiu a contramão da via.

No volante estava Jonathan Blasse de Brito Silveira, 20. Algmar morreu na hora. Mariza ficou internada por quatro dias. Em 10, terá que voltar ao hospital a fim de fazer outra cirurgia. O resultado do teste do bafômetro acusou que Jonathan tinha 0,63 miligramas de álcool por litro de ar expelido dos pulmões. Ele recebeu voz de prisão ainda no hospital. Na delegacia, foi indiciado por homicídio e tentativa de homicídio com dolo eventual — quando se assume o risco de matar. Levado à audiência de custódia, foi posto em liberdade menos de 24 horas após o fato, mediante o pagamento de R$ 8 mil de fiança. A reportagem fez contato com a família de Jonathan, mas um homem que se identificou como pai dele não quis dar entrevista.

Com a clavícula e a mão quebradas, dores no corpo e uma tristeza imensa, Mariza recebeu o Correio em casa, na sexta-feira, quando recebeu alta. “A dor física é pequena diante da dor da perda dele. Era um homem maravilhoso, um pai e um avô amoroso. Esse jovem acabou com a vida da minha família. Não sei onde ele está. Mas sei onde estou e onde o meu marido está. A única pessoa que está presa é o meu marido, em uma cova”, revolta-se (leia Depoimento). Família e amigos de Algmar preparam uma passeata para hoje, às 9h, em frente à Pizzaria Du’Cheff, na Quadra 402 de Samambaia Norte.

Consequências

O caso de Algmar e Jonathan se junta a dezenas de outros e engrossa uma estatística preocupante. A de jovens alcoolizados que deixam um rastro de mortos e feridos no trânsito do Distrito Federal. Em reportagem publicada na última segunda-feira, o Correio mostrou que um em cada cinco jovens mortos no asfalto está alcoolizado. Os números reais são maiores, pois falta incluir na conta quem morre 30 ou mais dias após o acidente. E as vítimas como Algmar. “Boa parte dos jovens é rebelde. Para eles, a lei não tem a menor importância. Só depois de sofrer as consequências de infringi-la”, avalia Dirceu Rodrigues Alves Júnior, chefe do Departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet).

Na avaliação de Rodrigues, uma das causas do desrespeito é a falha na fiscalização. “Não há como controlar 70 milhões de motoristas individualmente. Ainda não se fez nada para que isso (alcoolemia) fosse detectado de maneira coletiva. Nem para que o bafômetro fosse usado como equipamento de proteção individual, anexado ao veículo para que o condutor não usasse o veículo sob o uso de álcool”, diz.

No Distrito Federal, o desrespeito é maior entre os homens. Para cada 18 pegos alcoolizados ao volante, uma mulher acabou autuada pelo mesmo motivo. E as autuações só crescem. Na última década, a fiscalização emitiu 69.357 multas por desobediência à lei seca.

Depoimento

O carro como uma arma

“Fechamos a pizzaria e fomos buscar minha neta de 13 anos. Enxerguei perfeitamente o carro vindo muito rápido, para cima da gente, passando por cima de tudo. Acordei no chão, com os bombeiros ao lado, e não ouvia a voz do meu marido. Eles disseram que o estado dele era mais grave e já tinha ido para outro hospital. Soube da morte dele somente no fim do dia, após sair da cirurgia. Quando perguntei pelo Algmar, minha filha se afastou. Comecei a chorar. Não pude participar do velório, nem me despedir do meu marido. A dor física é muito pequena diante da dor da perda. Esse rapaz estraçalhou a nossa família. Interrompeu sonhos e planos. Queríamos ver nossos filhos formados. Estávamos comprando um apartamento e planejávamos a viagem dos sonhos: nós, nossos filhos e netos iríamos para o Nordeste de férias. Onde esse jovem está? Eu não sei. Sei onde estou e onde o meu marido está. Os governantes precisam entender que vidas estão sendo ceifadas porque o crime compensa. Você mata hoje no trânsito e amanhã está solto. Essa lei seca nunca foi cumprida. Gostaria de vê-lo punido. O que sei é que meu marido não morreu num acidente de trânsito. Ele foi morto por uma pessoa que fez uso do carro como uma arma.”

Lei seca

Ano

Embriaguez ao volante

Crime de dirigir alcoolizado

2015

14.144

2.049

2014

11.865

1.435

2013

6.276

1.863

2012

6.197

511

2011

9.767

785

2010

10.002

*

2009

6.808

*

2008

2.668

*

2007

1.008

*

2006

353

*

2005

269

*

*Entre 2005 e 2010, foram 3,6 mil casos = Fonte: Detran/DF

Um processo cultural

Para o sociólogo e professor de sociologia da Universidade Católica (UCB) Luís Otávio Teles Assumpção, o mau hábito se deve ao processo de formação social e cultural. “Muitas vezes, a pessoa não comete delito para não correr o risco de ser presa, pagar multa ou perder automóvel. E cria mecanismos, como aplicativos, para tentar escapar”, explica. O sociólogo alerta que isso é bem diferente de o cidadão ter a noção do perigo ao entrar no trânsito alcoolizado. “Uma coisa é: ‘Não dirijo porque tem repressão’. Outra coisa é: ‘Não dirijo alcoolizado porque tenho consciência’. A conscientização é um processo que precisa ser trabalhado de forma rápida e mais massificada possível no rádio, nos jornais e nas TVs”, defende.

Hartmut Gunther, professor da Universidade de Brasília e doutor em psicologia social, indica que, por trás do comportamento infrator do jovem, há outras razões, como o aumento da pressão de se mostrar e ter sucesso, ao mesmo tempo que as perspectivas profissionais não são as melhores. “O hábito de dirigir alcoolizado é um problema mundial e situações do tipo ‘bing drinking’ — beber até cair — estão aumentando, inclusive entre pessoas mais novas e mulheres.” 

O diretor de Policiamento e Fiscalização do Detran, Silvain Fonseca, acrescenta que o carro ainda hoje é símbolo de status. O crescente acesso aos bens de consumo provocou uma inversão de valores em relação à vida. “Isso os torna ainda mais vulneráveis. Não é só o consumo de bebida que preocupa, mas também o uso de outras drogas”, diz. Para ele, o grande avanço da lei seca foi respaldar a fiscalização e garantir a efetiva punição do infrator. “Antes, quando o motorista recusava o bafômetro, era levado para a delegacia. Demorava, o efeito do álcool já tinha passado e o exame clínico dava negativo”, relembra.

DIÁRIO GAÚCHO

Número de pessoas que admitem dirigir após beber tem queda de quase 20% em Porto Alegre

Os homens continuam assumindo mais a infração do que as mulheres

Com o endurecimento da Lei Seca, ocorrido em 2012, o número de motoristas de Porto Alegre que afirmam dirigir após beber teve queda de 18,7%. A mais recente pesquisa do Ministério da Saúde sobre o assunto aponta que, no ano passado, 3,9% da população da cidade declarou conduzir veículo após o consumo de qualquer quantidade de álcool, contra 4,8% de 2012.

Os homens (6,2%) continuam assumindo mais a infração do que as mulheres (1,9%), assim como na proporção nacional, que é de 9,8% (homens) contra 1,8% (mulheres). Entre as 27 capitais, 5,5% dos indivíduos referiram dirigir após o consumo de bebidas alcoólicas contra 7% em 2012 — queda de 21,5%. Quatro capitais se destacam na pesquisa com queda superior a 50% nos últimos três anos: Fortaleza (54,1%), Maceió (53,2%), João Pessoa (51,4%) e Vitória (50,7%). Apresentaram aumento no índice Cuiabá (15,8%) e Boa Vista (13,2%).

De acordo com a pesquisa de 2015, 8,7% da população de 25 a 34 anos admite beber e dirigir. O número é duas vezes maior do que o registrado na população de 18 a 24 anos e quatro vezes maior do indicado em homens e mulheres de 65 anos ou mais. Outro índice importante é o nível de escolaridade: a pesquisa detectou que, quanto maior o grau de instrução, maior é o número de pessoas que assumem o risco.

Os dados são da pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel 2015) que realizou mais de 54 mil entrevistas nas capitais dos 26 estados e no Distrito Federal. O levantamento é realizado anualmente, desde 2006, pelo Ministério da Saúde. Os dados são coletados e analisados por meio de uma parceria com o Núcleo de Pesquisa em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (USP).

Atualmente o condutor que ingerir qualquer quantidade de bebida alcoólica e for submetido à fiscalização de trânsito está sujeito a multa de R$ 1.915,40 e suspensão do direito de dirigir por 12 meses. Em caso de reincidência, o valor é dobrado.

EXPRESSO MT 

Número de adultos que dirigem após beber aumenta 15,8% em Cuiabá

Nos últimos três anos, Cuiabá teve aumento de 15,8% no número de pessoas que admitem que dirigem mesmo depois de terem consumido bebida alcoólica. Os dados são da pesquisa Vigitel, do Ministério da Saúde, e foram divulgados neste sábado (18). Em 2015, 11,7% das pessoas da capital mato-grossense admitiram que tinham dirigido depois de beberem, enquanto em 2012 esse índice foi de 10,1%.

Nesta semana, a Delegacia de Trânsito divulgou que 47 pessoas morreram em acidentes de trânsito em Cuiabá entre janeiro e o início de junho de 2016, sendo que os fatores que mais contribuíram foram motoristas dirigindo em alta velocidade ou depois de beber.

Os números da Vigitel colocam Cuiabá, assim como Boa Vista, em Roraima, na contramão em relação à maior parte das capitais brasileiras, que apresentaram queda nesses números nos últimos três anos.

Na média nacional, segundo a pesquisa, 5,5% das pessoas disseram que dirigiram após o consumo de bebidas alcoólicas, contra 7% de 2012, o que representa diminuição de 21,5%.

Na capital mato-grossense, a maioria dos que conduzem veículos motorizados após ingerirem bebidas alcoólica é formada por homens (8,7%), segundo o levantamento.

De acordo com a Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) de 2015, 8,7% da população de 25 a 34 anos admite beber e dirigir. Esse número é duas vezes maior do que da população de 18 a 24 anos, e quatro vezes maior do que o grupo de homens e mulheres que têm 65 anos ou mais.

O levantamento também constatou que, quanto maior o grau de instrução, maior é o número de pessoas que assumem o risco. A Vigitel 2015 realizou mais de 54 mil entrevistas nas capitais dos 26 estados e no Distrito Federal.

Atualmente, por causa da Lei Seca, o motorista que beber qualquer quantidade de bebida alcoólica e for pego numa fiscalização de trânsito está a sujeito a multa de R$ 1,9 mil e suspensão do direito de dirigir por um ano.

FOLHA DE VITÓRIA

Cai em 50,7% número de adultos em Vitória que bebem e dirigem

O endurecimento da Lei Seca, no ano de 2012, está surtindo efeito entre os motoristas da capital do Espírito Santo. Segundo a mais recente pesquisa do Ministério da Saúde, o percentual de adultos que admitem beber e dirigir em Vitória teve queda de 50,7%.

No ano passado, 3,2% da população da cidade declararam que dirigiam após o consumo de qualquer quantidade de álcool, contra os 6,5% do ano de 2012. Os homens (4,9%) continuam assumindo mais a infração do que as mulheres (1,8%) da capital.

No conjunto das 27 capitais estudadas pela pesquisa, 5,5% dos indivíduos referiram conduzir veículos após o consumo de bebidas alcoólicas, contra os 7% de 2012 – uma queda nacional de 21,5%. Assim como foi constatado em Vitória, a proporção nacional é maior entre homens (9,8%) do que entre mulheres (1,8%).

Apesar disso, desde o endurecimento da lei seca menos homens têm assumido os riscos da mistura álcool/direção na média das 27 capitais pesquisadas: a redução foi de 22,2%, entre 2012 e 2015, na população masculina.

Entre as capitais brasileiras, quatro se destacaram com queda superior a 50% nos últimos três anos: Fortaleza (54,1%), Maceió (53,2%), João Pessoa (51,4%) e Vitória (50,7%). Algumas capitais, contudo, apresentaram aumento do número de adultos que referiram assumir o volante após consumir qualquer quantidade de álcool: Cuiabá e Boa Vista apresentaram alta de 15,8% e 13,2%, respectivamente, desde 2012.

A população adulta de Florianópolis (13%), Palmas (11,9%) e Cuiabá (11,7%) estão entre as que mais abusam da combinação álcool e direção. Na contramão, Recife (2,6%), Maceió (2,9%) e Vitória (3,2%) se destacaram com o menor percentual de entrevistados que declararam beber e dirigir. “É cada vez mais notória a importância da Lei Seca em inibir a população brasileira de se arriscar na mistura do álcool com o volante. Agora temos que continuar nessa batalha, principalmente entre os jovens de 25 a 34 anos, que apresentaram o maior índice da infração entre todas as faixas etárias pesquisadas”, declarou o ministro da Saúde, Ricardo Barros.

De acordo com a pesquisa de 2015, 8,7% da população de 25 a 34 anos admitem beber e dirigir. O número é duas vezes maior do que o registrado na população de 18 a 24 anos e quatro vezes maior do indicado em homens e mulheres de 65 anos ou mais. Outro índice importante é o nível de escolaridade: a pesquisa detectou que, quanto maior o grau de instrução, maior é o número de pessoas que assumem o risco.

Os dados são da pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel 2015) que realizou mais de 54 mil entrevistas nas capitais dos 26 estados e no Distrito Federal. O levantamento é realizado anualmente, desde 2006, pelo Ministério da Saúde. Os dados são coletados e analisados por meio de uma parceria com o Núcleo de Pesquisa em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (USP).

ROAD SAFETY - No ano passado o Brasil foi sede da 2ª Conferência Global de Alto Nível Sobre Segurança no trânsito. Na ocasião, os mais de 130 países presentes reafirmaram as metas de reduzir à metade, até 2020, o número de mortes e lesões causadas pelo trânsito em todo o mundo, e de aumentar de 15% para 50% o percentual de países com legislação abrangente sobre os cinco fatores-chaves de risco – não uso de cinto de segurança, de capacete e de dispositivos de proteção para crianças, mistura álcool/direção e excesso de velocidade.

O reforço dos países a estratégias de policiamento nas vias e medidas de fiscalização com foco na redução de acidentes também está entre as recomendações, assim como incentivar os Estados a introduzirem novas tecnologias de gestão do trânsito e de sistemas de transporte inteligente, para mitigar os riscos de lesões e mortes.

Na área da Saúde, o documento apontou a necessidade de fortalecer os cuidados pré-hospitalares, incluindo serviços de saúde de emergência e resposta imediata pós-acidente, diretrizes ambulatoriais e hospitalares para cuidado do trauma, além de serviços de reabilitação.

LEI SECA - Em 2016, a lei seca completa 8 anos de vigência. Além de mudar os hábitos dos brasileiros, a lei trouxe um maior rigor na punição e no bolso de quem a desobedece. Com o passar dos anos, a lei passou por mudanças e ficou mais severa com o objetivo de aumentar a conscientização de não se misturar a bebida com direção. Atualmente o condutor que ingerir qualquer quantidade de bebida alcoólica e for submetido à fiscalização de trânsito está sujeito a multa no valor de R$ 1.915,40 e suspensão do direito de dirigir por 12 meses. Em caso de reincidência, o valor da multa é dobrado.

Acompanhando a implementação da lei, o Vigitel passou a estimar a frequência de indivíduos que referiram conduzir veículo motorizado após o consumo de bebida alcoólica, independentemente da quantidade de bebida consumida e da periodicidade dessa prática.

“Precisamos avançar no marco regulatório do álcool, da mesma forma que estamos fazendo em relação ao tabaco. É necessário proteger vidas”, destaca a diretora do Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde do Ministério da Saúde, Fátima Marinho.