Construir cidades está na mira da Alphabet

27/04/2016 08:54 - Valor - The Wall Street Journal

ELIOT BROWN - THE WALL STREET JOURNAL

A Alphabet, holding do Google, tem uma legião de desenvolvedores de internet. Em breve, ela pode precisar de incorporadores de imóveis.

Nas próximas semanas, altos executivos da gigante de tecnologia americana vão analisar uma ambiciosa proposta da sua subsidiária de tecnologia urbana, a Sidewalk Labs, que pretende mergulhar em uma arena completamente nova: a construção de cidades.

Pessoas a par dos planos da Sidewalk dizem que a unidade da Alphabet está dando os toques finais na proposta para estrear no negócio de desenvolver novos bairros gigantes com imóveis residenciais, escritórios e lojas em cidades já existentes.

A companhia procuraria cidades com vastas áreas disponíveis que elas querem reurbanizar - provavelmente municípios às voltas com dificuldades financeiras e deterioração de algumas áreas -, talvez por meio de processos de licitação, dizem as pessoas. A Sidewalk poderia formar parcerias com uma ou mais dessas cidades para construir bairros que, além de abrigar dezenas de milhares de moradores e funcionários de empresas, seriam profundamente integrados com a tecnologia.

O objetivo é criar campos de prova para as cidades do futuro, criando uma área para a experimentação de ideias que vão de carros que se autodirigem a uma infraestrutura mais eficiente de fornecimento de energia elétrica e água, dizem as fontes.

Detalhes da iniciativa, divulgada no início do mês pelo site americano de notícias de tecnologia "The Information", são raros. Mais importante, não está claro quem arcaria com os custos desses projetos - dezenas de bilhões de dólares -, já que empreendimentos de grande escala geralmente exigem investidores externos dispostos a esperar anos ou décadas pelo retorno.

Mas um elemento crucial da proposta é que a Sidewalk solicitaria autonomia com relação a muitas regulações dos municípios, para que ela possa construir nessas áreas sem limitações como locais de estacionamento ou o desenho das ruas, dizem essas pessoas.

Se a Alphabet der luz verde ao projeto da Sidewalk, ele poderia ser incluído na mesma categoria de outros investimentos ambiciosos e de resultados incertos do Google, como a divisão de carros autônomos.

A Sidewalk foi criada no ano passado a partir de uma ideia do diretor-presidente da Alphabet, Larry Page, e do líder da própria Sidewalk, Daniel Doctoroff, que foi o secretário de desenvolvimento econômico da cidade de Nova York durante os seis primeiros anos do mandato do prefeito Michael Bloomberg.

Doctoroff era conhecido por sua abordagem tecnocrata para com os assuntos de governo e por seus projetos ambiciosos de desenvolvimento urbano, muitos deles envolvendo a conversão de antigas áreas industriais de Manhattan e do Brooklyn em bairros onde prédios comerciais e de apartamentos pipocaram nos últimos dez anos.

Doctoroff comandou a empresa de mídia de Bloomberg, a Bloomberg LP, e no ano passado abriu a Sidewalk, descrevendo-a como uma empresa que usaria a tecnologia para ajudar a transformar cidades.

Em uma palestra realizada em fevereiro na Universidade de Nova York, ele chegou a dizer que iniciativas anteriores de construir cidades "inteligentes" ou bairros integrados à tecnologia falharam porque, normalmente, os planejadores urbanos e executivos de tecnologia não conseguem se entender.

"É por isso que acreditamos que a união do Google, que se concentra em tecnologia, comigo, que me concentro em qualidade de vida, urbanismo etc, seja uma combinação relativamente única", disse ele.

Um desafio que a companhia pode enfrentar é que casos passados de construção de cidades e de projetos de desenvolvimento urbano de larga escala são repletos de falhas e decepções. Cidades construídas do zero, como Brasília e Canberra, na Austrália, são consideradas antissépticas e sem a atmosfera vibrante das cidades que surgiram mais organicamente.

"Você pode construir uma cidade do zero e você pode copiar e imitar as melhores qualidades das cidades", diz Glen Kuecker, professor de história da Universidade DePauw, no Estado americano de Indiana, que estudou Songdo, um bairro próximo à Seul, capital da Coreia do Sul, e outras cidades inteligentes. "Ainda é um lugar muito artificial e estéril."

Projetos de grande escala dentro de cidades também são frequentemente marcados por atrasos e falhas. O Battery Park City, um parque no sul de Manhattan, levou 40 anos e quase ficou insolvente até ser concluído, assim como aconteceu com o bairro de Playa Vista, em Los Angeles, ao norte do aeroporto da cidade.

Isso se deve ao fato de os incorporadores estarem expostos não somente às oscilações do mercado, mas também a dinâmicas políticas que mudam com frequência.

"Você tem barreiras políticas, você tem políticas econômicas, às vezes você tem barreiras ambientais", diz Eugenie Birch, professora de planejamento urbano da Universidade da Pensilvânia.