02/10/2014 06:58 - O Globo
RIO - A desigualdade de renda cresceu no mundo entre 1820 e
2010, mostra um estudo inédito da Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico (OCDE). Esse movimento foi causado principalmente por
um salto na desigualdade entre os países, mais do que dentro dos países. O
relatório "Como era a vida” reúne pela primeira vez indicadores entre os anos
de 1820 e 2010, percorrendo quase dois séculos de estatísticas que ajudam a
explicar a qualidade de vida da população, como desigualdade de renda, Produto
Interno Bruto (PIB) per capita, educação, expectativa de vida e altura da
população, instituições políticas, qualidade ambiental e desigualdade de
gêneros, entre outros aspectos.
O índice de Gini (que mede a desigualdade, entre zero e 100) que compara os países entre si aponta um aumento expressivo entre 1820 e 2010, passando de 16 para 54. Se for considerada a desigualdade entre os países, o índice oscila ao longo das décadas, mas chega a 2010 ao mesmo nível de 45 que estava em 1820.
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"O aumento na desigualdade de renda vivido entre 1820 e os
anos 2000 foi fortemente causado pelo crescimento na desigualdade entre os
países mais do que na desigualdade entre os países”, aponta o documento.
O comportamento da desigualdade de renda variou entre os
países ao longo das décadas. No Reino Unido, o índice de Gini estava em 59 nos
anos 1820 e recuou para 40 nos anos 2000. Nos Estados Unidos, a taxa, que era
de 57 em 1820, foi a 44 na primeira década do século XXI. Já no Brasil o índice
de Gini avançou de 47 nos anos 1820 para 61 nos anos 2000.
Se consideramos as últimas três décadas, no entanto, houve
um aumento da desigualdade dentro dos países. O índice de Gini mundial que
considera a desigualdade intrapaíses passou de 36 na década de 80 para 39 na
década de 90 e 45 na década de 2000. Essa tendência também pode ser observada
nos indicadores das regiões. Na Europa Ocidental, o Gini subiu de 36 nos anos
80 para 38 nos anos 90 e 40 nos anos 2000. Nos países desenvolvidos do chamado
Novo Mundo — Estados Unidos, Austrália e Canadá —, essas taxas foram de 37, 39
e 44, respectivamente. A região da América Latina e Caribe apresentou índice de
Gini de 52,52 e 54, respectivamente.
Segundo a OCDE, esse aumento recente da desigualdade dentro
dos países está ligado ao processo de globalização, que ao mesmo tempo leva a
um declínio na desigualdade entre os países. Esse segundo movimento, no
entanto, ocorre em ritmo bem mais lento: o índice de Gini entre os países se
manteve em 56 nas décadas de 70, 80 e 90, e caiu para 54 na década de 2000.
PIB PER CAPITA CRESCEU MAIS DE DEZ VEZES EM DOIS SÉCULOS
Quando se olha o Produto Interno Bruto (PIB) per capita
mundial na passagem entre os séculos XIX e XXI, é possível afirmar que houve
uma alta de mais de dez vezes entre 1820 e 2010, passando de US$ 605 para US$
7.890. Os números consideram dólares americanos em paridade do poder de compra
dos anos 90.
O relatório da OCDE aponta que não houve nenhum país ou
região com recuo na renda real neste período, embora haja alguns casos de
redução temporária, como na China no século XIX, o Leste Europeu depois do fim
do comunismo e algumas partes da África nos anos 80 e 90.
Ainda há fortes diferenças entre as regiões e os países. O
PIB per capita da Europa Ocidental subiu de US$ 1.226 na década de 1820 para
US$ 20.841 na década de 2000. Na América Latina, o aumento foi de US$ 595 para
US$ 7.109, considerando a mesma base de comparação.
No Brasil, o PIB per capita saltou de US$ 683 para US$
6.879, mas houve um recuo do PIB per capita entre 1890 e 1900 — década pouco
depois da proclamação da república e com a Revolta da Armada e a Guerra de
Canudos.
Um destaque no relatório é o caso da Argentina, que tinha
PIB per capita de US$ 998 nos anos 1820, maior do que a da Suécia (US$ 888).
Depois de um crescimento contínuo até os anos 80 (com exceção da década de
1910), a Argentina viu seu PIB per capita oscilar, até chegar a US$ 10.256 nos
anos 2000. Nesse período, o PIB per capita sueco correspondia a 2,5 vezes ao
argentino.
O documento destaca ainda o crescimento mais rápido da
economia dos países de renda mais baixa, em especial da Ásia, desde os anos 70
— movimento diferente do que ocorria até então.