BRASÍLIA - Pressionada por gastos públicos e com apenas uma empresa interessada no leilão, a presidente Dilma Rousseff prepara o adiamento do bilionário projeto do trem-bala, ligando Campinas, São Paulo e Rio. Em reunião realizada na noite de ontem, no Palácio do Planalto, Dilma disse que, se o governo não conseguir mobilizar mais empresas, o leilão do Trem de Alta Velocidade (TAV), previsto para setembro, não será realizado.
Diante de um cenário de dificuldades políticas e econômicas,
Dilma avalia agora que é melhor investir em mobilidade urbana nas grandes
capitais, um dos motivos dos protestos de junho, a aplicar o escasso dinheiro
do Orçamento no trem-bala neste momento.
Com a decisão, a presidente também se descola do cartel sob
investigação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). As empresas
investigadas por formação de cartel em licitações do metrô e de trens nos
governos de Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra (PSDB), em São Paulo,
eram as mesmas que demonstraram interesse em fornecer tecnologia e material
rodante para o trem-bala.
O Estado apurou que apenas a espanhola CAF, agora, está
interessada no leilão. As outras empresas desistiram. A Siemens, delatora do
esquema de cartel, pediu adiamento do leilão para ter mais tempo de organizar
um consórcio.
A avaliação majoritária no governo é que não há clima para
iniciar agora um empreendimento considerado "faraônico" pelos
críticos, com investimentos de R$ 34,7 bilhões, quando a população exige
melhorias no transporte urbano.
Na reunião de ontem, Dilma disse que a prioridade, hoje, é
investir em corredores de ônibus e terminais de integração. No mês passado, ao
lado do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, ela anunciou um pacote de R$ 8
bilhões para mobilidade urbana.
O ministro dos Transportes, César Borges, e o presidente da
Empresa de Planejamento e Logística, Bernardo Figueiredo, participaram da
reunião com Dilma, que também contou com a presença de Guido Mantega (Fazenda),
Miriam Belchior (Planejamento) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil).
Risco. A
presidente poderá deixar o projeto do trem-bala para o segundo mandato, caso
seja reeleita, em 2014. Incertezas econômicas também pesam na decisão. A queixa
generalizada no mercado é que o TAV é um projeto arriscado e de baixa
rentabilidade. Outro fator de desânimo é a ausência de um sócio brasileiro de
peso.
Para piorar, o governo fixou uma Taxa Interna de Retorno
(TIR) de 7% para o empreendimento. As rodovias que vão a leilão no mês que vem
têm rentabilidade de 7,22%. Em conversas reservadas, ministros afirmam que há
muita divergência no governo sobre o tema.
O risco de pôr um projeto emblemático de Dilma sob o comando
de um cartel preocupa o Planalto, mas o nicho de fornecedores de tecnologia de
trens de alta velocidade é muito restrito. Por isso, a "coincidência"
entre interessados no projeto e os integrantes do conluio que agiu em governos
tucanos já era de se esperar.
De qualquer forma, o cartel investigado pelo Cade não é tido como um empecilho ao leilão do ponto de vista técnico.
Valor Econômico
Dilma hesita em decisão sobre trem-bala
Os espanhóis desistiram de
entregar uma proposta, no dia 16, para o leilão do trem-bala Rio-São
Paulo-Campinas. Com isso, somente o consórcio francês se mantém na disputa
Os espanhóis desistiram de entregar uma proposta, no dia 16,
para o leilão do trem-bala Rio-São Paulo-Campinas. Com isso, somente o
consórcio francês se mantém na disputa. Mesmo assim, empresas envolvidas na
concorrência fizeram uma leitura negativa das propostas divulgadas pelo
governo, nas últimas 48 horas, para a entrada de "sócios
estratégicos" no capital da futura concessionária do trem de alta
velocidade (TAV). Esse cenário reforça a inclinação da presidente Dilma
Rousseff de adiar o leilão, mas ela ainda não havia tomado uma decisão até
ontem.
A possibilidade de ter apenas uma empresa na disputa do
empreendimento incomoda o governo, porque não haveria nenhum tipo de competição
em torno do projeto, em um momento delicado do noticiário político. As grandes
empresas do setor ferroviário interessadas no TAV são alvos de investigações de
práticas de cartel em obras dos metrôs de São Paulo e do Distrito Federal. Além
disso, o governo tomou iniciativas recentes para destravar projetos de
mobilidade urbana nas principais capitais do país, após as manifestações
populares. Diante do contexto desfavorável, a presidente pensa seriamente em
adiar o leilão.
Dilma convocou um grupo restrito de ministros e auxiliares para
uma reunião ontem à noite, no Palácio do Planalto, fora de sua agenda oficial.
Ela não comunicou aos seus assessores nenhuma decisão final e deverá voltar a
reuni-los entre hoje e amanhã.
A saída do consórcio espanhol foi levada ontem à Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e complicou ainda mais a equação do
governo. A Renfe, operadora que encabeçava o grupo, se vê às voltas com outra
prioridade: o rescaldo do acidente em Santiago de Compostela. O consórcio
informou oficialmente ao governo brasileiro que não se trata de uma linha de
alta velocidade - com trens rodando a mais de 300 quilômetros por hora - e
mantém o interesse na disputa, mas deixou claro que as questões domésticas são
mais urgentes e só pode participar de um leilão no Brasil se tiver mais tempo.
Dilma se sente extremamente desconfortável em levar adiante
um leilão tão polêmico com apenas um concorrente. Ela está convencida sobre a
viabilidade do trem-bala, mas sabe que o projeto não "pegou" na
opinião pública e percebe que será criticada se o leilão tiver como vitorioso
um consórcio liderado pela Alstom, empresa francesa listada como uma das
beneficiárias do suposto cartel investigado pelo Cade.
A Alstom e a estatal SNCF, que opera os trens na França,
estão firmes na disputa. No entanto, fontes que acompanham de perto o processo
de concessão do trem-bala dizem que houve insatisfação com os termos das cartas
divulgadas pelo governo nas últimas horas, detalhando o apoio financeiro à
futura concessionária.
O BNDES se comprometeu a entrar com até 20% do capital
social ou 30% do equity da empresa responsável pela operação do trem-bala. Esse
foi um dos poucos pontos elogiados. Na definição de uma fonte ligada aos
consórcios que estudaram o projeto, a carta dos Correios é "vergonhosa"
e não tem efeitos práticos.
A estatal diz que "intenciona participar" do
capital do TAV, mas não informa percentuais, nem valores. Um grupo de quatro
investidores institucionais - BB Investimentos, Previ, Petros e Funcef -
assinou uma carta em que detalha as condições de participação. São condições
consideradas inviáveis pelo mercado.
O BB Investimentos e os fundos de pensão exigem
rentabilidade de 8,5% ao ano, mais inflação, para entrar. Eles afirmam que, se
essa remuneração não for alcançada, podem negociar uma cláusula que força a
compra de suas ações na empresa do trem-bala.
Na configuração societária do TAV, conforme o desenho do
governo, a Empresa de Planejamento e Logística (EPL) terá 45% de participação.
Os consórcios estrangeiros sempre foram claros em dizer que não aceitavam ficar
com os 55% restantes. Por isso, houve o compromisso de entrada dos sócios
estratégicos, como o BNDES, os fundos de pensão e os Correios. A avaliação dos
grupos, porém, foi de que esse processo demorou demais e sobrou pouco tempo
para uma análise.
A favor da realização do leilão, que tem a entrega de
propostas marcada para o dia 16 de agosto e o resultado previsto para 19 de
setembro, pesa no governo a percepção de que os franceses garantiriam o sucesso
da concorrência. Tudo somado, as chances de manter as datas são baixas.
Folha de SP
Consórcios querem adiar leilão do trem-bala
Consórcios da Espanha e da
Alemanha pediram ao Brasil o adiamento do leilão do trem-bala, marcado para o
dia 13. Solicitação reforça ala do governo que defende postergação da licitação
Os consórcios da Espanha e da Alemanha pediram ao Brasil o
adiamento do leilão do trem-bala, marcado para o dia 13. A solicitação reforça
a ala do governo que defende a postergação da licitação.
Segundo a Folha apurou, a presidente Dilma Rousseff já
confidenciou a assessores que deve adiar a disputa, mas faltariam detalhes para
tomar uma decisão final.
Além de questões técnicas, pesam na decisão presidencial os
protestos de ruas que questionaram a prioridade do trem-bala diante da
necessidade de investir em metrôs.
O tema foi discutido ontem à noite por Dilma e os ministros
Guido Mantega (Fazenda) e César Borges (Transportes), além do presidente da EPL
(Empresa de Planejamento e Logística), Bernardo Figueiredo.
Um grupo defende o adiamento sem data definida de retomada.
Outro deseja um adiamento curto, para dar tempo aos consórcios de se organizar.
Outros acreditam que essa definição deveria ficar para depois das eleições.
Um terceiro consórcio, da França, mantém sua disposição de
participar da licitação na data agendada. Defensores do adiamento afirmam que
seria ruim fazer um leilão com só um competidor.
A Folha apurou que o governo espanhol encaminhou ontem carta
às autoridades brasileiras formalizando o pedido de adiamento do leilão.
A justificativa é que o consórcio quer participar da
disputa, mas precisa de mais tempo para analisar e formalizar a proposta.
O consórcio alemão solicitou informalmente, há cerca de duas
semanas, a transferência do leilão para outra data também para analisar e
preparar uma proposta.
Anunciado em 2007, o projeto do TAV (trem de alta velocidade) brasileiro, ligando São Paulo ao Rio, já teve dois adiamentos, e a terceira tentativa de leilão não chegou a atrair interessados.