Estudo do elo entre uso do solo e transporte pode beneficiar cidades - Claudio Bernardes

11/09/2017 07:42 - Folha de SP

A distribuição das atividades no tecido urbano e a maneira como elas estão conectadas geograficamente afetam o transporte. Por outro lado, as decisões com relação à estruturação do sistema de transporte afetam os padrões de uso do solo urbano. Ou seja, transporte e uso do solo têm importantes interações no processo de desenvolvimento das cidades.

Inúmeros estudos têm procurado identificar os fatores relacionados ao uso do solo e como eles afetam a mobilidade. Contudo, esses fatores se superpõem e as análises que os tratarem isoladamente podem avaliar equivocadamente seus efeitos.

São inúmeros os fatores que influenciam a locomoção nas cidades. Examinar a interação existente e as consequências de suas diversas combinações possíveis não é uma tarefa fácil.

Por exemplo, a adequada combinação de densidade de pessoas e empregos pode reduzir o número de viagens com automóveis e aumentar o uso de modos alternativos de transporte. Estudos demonstram que o aumento de 10% nos modos de transporte alternativos como fator isolado reduz em aproximadamente 1% a distância percorrida por automóveis. Mas essa redução pode chegar a 4% se estiver associada a outros fatores, como mistura de usos, conectividade e acessibilidade a transportes ativos de pedalar e caminhar.

Mudanças de comportamento com relação a deslocamentos e causadas pela implementação de diferentes modelos de uso do solo podem ajudar a resolver problemas e a atingir objetivos de planejamento. O aumento da densidade, por exemplo, pode aumentar a intensidade do tráfego local. Porém, a consequente redução da distância percorrida por veículos pode reduzir os congestionamentos no âmbito regional.

Estratégias de gerenciamento de uso do solo podem ser praticadas em várias escalas geográficas. Por exemplo, agrupar lojas em um shopping center tende a melhorar o acesso dos compradores em comparação à oferta do mesmo tipo de comércio espalhado ao longo de uma avenida. Concentrar casas, lojas e escritórios em um mesmo bairro melhora o acesso para moradores e trabalhadores. O agrupamento de inúmeros edifícios residenciais e comerciais perto de uma estação de transporte público pode reduzir a necessidade de ter e de usar automóvel.

Dados sobre densidade urbana estão amplamente disponíveis e, por essa razão, têm sido os fatores de uso do solo mais comumente avaliados. O adensamento, que muitas vezes de forma isolada gera resultados relativos, associado a outros fatores ligados à mobilidade, como acessibilidade regional, mistura de usos, conectividade da rede viária e opções de transporte, pode resultar na cidade compacta, modelo extremamente positivo.

Devido à complexidade da criação de modelos integrados e sensíveis aos fatores relacionados ao uso do solo, algumas organizações desenvolveram modelos simplificados e direcionados à avaliação de estratégias voltadas ao crescimento inteligente.

Dentre outros modelos existentes, destaca-se o "rapid fire model", uma ferramenta desenvolvida pela "Vision California" com o intuito de avaliar os cenários regionais de uso do solo e transporte, incluindo várias combinações de densidade, mistura de usos, tipos de construção e políticas de transporte. Prevê impactos das viagens de veículos, emissões de poluição, uso de água e energia nos edifícios, uso de combustível no transporte e custos com infraestrutura pública.

As ferramentas estão disponíveis. Devemos nos aprofundar no estudo dessa clara relação entre zoneamento e transporte para podermos nos beneficiar, da melhor forma possível, dos modelos mais adequados para a distribuição das atividades no território urbano. 

Claudio Bernardes - É engenheiro civil e atua como empresário imobiliário há mais de 30 anos. É presidente do Conselho Consultivo do Secovi-SP