09/06/2014 09:25 - O Globo
RIO - O Bosque Paradiso, na Estrada do Rio Grande, na
Taquara, já foi um condomínio de classe média que fazia jus ao nome. Os
moradores das casas, que chegavam a ter mais de 400 metros quadrados, tinham
até um clube exclusivo, com sala de ginástica, quadra de tênis e piscina. Em
poucas semanas, o eldorado se transformou em ruínas, para permitir a passagem
do BRT Transolímpico, que ligará a Barra da Tijuca a Deodoro, projeto previsto
para ser concluído até os Jogos Olímpicos de 2016. A prefeitura divulgou que já
pagou mais de R$ 30 milhões em indenizações aos moradores de 32 casas e lotes
no Paradiso. Há no condomínio, 40 construções e 16 terrenos.
As despesas para desapropriar o condomínio equivalem até
agora a cerca de 20% dos R$ 154,6 milhões já pagos, desde o ano passado, em indenizações
a proprietários de imóveis no caminho do futuro BRT. Um dos valores mais
elevados foi o de um motel: o Caravellas, que recebeu R$ 8 milhões da
prefeitura. Também constam da lista de indenizados um centro espírita e uma
igreja evangélica. Ao todo, 248 imóveis foram desapropriados, dos quais 82
ainda estão em fase de negociações com os moradores ou em discussão na Justiça.
Apesar dos valores, muitos ex-moradores do Bosque Paradiso
não ficaram satisfeitos com o que receberam da prefeitura. Eles alegam que o
dinheiro não cobre despesas para comprar outro imóvel do mesmo padrão.
- O que recebi equivale realmente ao que investi. Mas há
algo que não é indenizável: o valor sentimental. Perdi a casa dos meus sonhos.
Enquanto não encontro outro imóvel tão bom para morar, estou vivendo num
apartamento alugado, que tem 70 metros quadrados e equivale ao tamanho da
piscina da casa que perdi - contou o administrador de empresas Marco Antônio
Rosa Machado, de 46 anos.
Os últimos moradores se mudaram há pouco mais de um mês,
quando começaram as demolições. A placa de identificação do condomínio foi
retirada, e seguranças contratados pelas empreiteiras tomam conta da área. O
local ainda é frequentado por alguns ex-moradores, que removem telhas,
esquadrias de alumínio, portas e outros objetos que possam ser reutilizados. A
maioria das famílias optou por fechar acordos amigáveis com a prefeitura, para
poder levar as estruturas das casas. Pelo menos quatro famílias, que decidiram
discutir os valores na Justiça, não têm direito a retirar nada.
- Com o que vou retirar daqui, economizarei pelo menos de
30% a 40% na compra de materiais para uma casa nova. Mas, infelizmente, com a
indenização que recebi, só vou conseguir construir no Recreio. A implantação do
Transolímpico acabou valorizando demais os terrenos no entorno. Não encontro
nada no mesmo padrão do que o que eu tinha no Paradiso - lamenta o analista
aposentado Claudio Cardoso Weiss, de 55 anos.
O maior valor pago pela prefeitura foi de R$ 10,9 milhões à
Associação Bosque Paradiso. A indenização se refere às benfeitorias do clube -
de uso comum dos moradores -, que foi rateada entre todos. Da varanda do clube,
que dá vista para a floresta, as ruínas das casas também chamam a atenção. As
folhas mortas e a água de chuva acumulada na piscina empoeirada denunciam o
sinal de abandono. Em média, a prefeitura pagou entre R$ 1 milhão e R$ 1,5
milhão por casa. Quem tinha apenas terrenos sem imóvel recebeu, em média, R$
300 mil.
A construção do corredor propriamente dito custará R$ 1,9
bilhão, numa parceria público-privada. A diferença para os outros BRTs já
implantados (Transcarioca e Transoeste) é que o Transolímpico terá também uma
via expressa, sem sinais, para carros, com cobrança de pedágio, além de faixas
exclusivas para ônibus. Ao todo, terá 23 quilômetros, 18 estações e dois
terminais. Haverá conexões com o Transoeste, no Recreio; o Transcarioca, na
Taquara; e os trens da SuperVia, em Deodoro.
O financiamento do corredor será feito pela iniciativa
privada, por meio do sistema de concessão, que abrange construção, manutenção e
operação da via durante 35 anos. A previsão é que o tempo de viagem da Barra a
Deodoro caia de 1h50m para 40 minutos.
Mas o bota-abaixo poderia ter sido maior. O projeto foi
alterado para reduzir os custos de indenizações. O Estudo de Impacto
Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental (Eia/Rima) chegou a estimar que 2.172
imóveis residenciais e comerciais poderiam ser demolidos. As mudanças
preservaram de pé, por exemplo, parte das casas da antiga vila de funcionários
da Colônia Juliano Moreira e a Escola Municipal Silveira Sampaio, em Curicica,
considerada uma referência em prática esportiva no Rio.
Segundo a prefeitura, o projeto original do Transolímpico
previa a construção de um túnel sob o Maciço da Pedra Branca, com 3.800 metros
de extensão, por baixo das moradias. O plano foi revisto para cortar gastos. O
túnel foi encurtado para 1.800 metros, com a construção de viadutos que
cruzarão a área do condomínio. Para preservar as casas, a opção seria construir
um mergulhão, orçado em pelo menos R$ 600 milhões.
O secretário de Obras, Alexandre Pinto, disse que o destino
dado aos escombros do condomínio será sustentável:
- Os restos das casas serão triturados e usados na
terraplanagem dos terrenos.
UM CEMITÉRIO NO TRAJETO
No canteiro de obras do Transolímpico, sobrou até para um
cemitério. A construção da rampa de acesso de um dos viadutos da via expressa
levou a prefeitura a desapropriar o muro da entrada do Jardim da Saudade, em
Sulacap. A administração afirma que o projeto precisou ser revisto, porque, na
primeira versão, túmulos seriam atingidos — o que é negado pela Secretaria
municipal de Obras. No acordo com o município, a Imperial Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, que administra o
cemitério, recebeu R$ 650 mil de indenização.
— As empreiteiras que fazem a obra também construíram um
novo muro. No fim, o cemitério não foi atingido — disse o procurador-geral da
Irmandade, Jovelino Ribeiro.
Quem também escapou da remoção foi a Igreja de São José, em
Magalhães Bastos, preservada após acordo com Exército, que permitiu a passagem
da via por seu terreno.