03/11/2015 08:35 - Tribuna de Minas
Sem considerar os riscos, cada vez mais pessoas aderem à
prática de viajar utilizando "caronas” pagas oferecidas em grupos do Facebook.
As viagens são feitas em carros particulares e, muitas vezes, por motoristas
sem experiência com o trânsito nas rodovias. Por outro lado, o condutor também
não tem garantias sobre quem irá acompanhá-lo. Todavia, motorista e carona
defendem que a prática traz economia e comodidade. Portanto, não concordam com
as proibições e regulações da prática. Este tipo de transporte que ganha cada
vez mais adeptos com as redes sociais é considerado ilegal e já representa um
desafio para as empresas de transporte de passageiros, que precisam lidar com a
concorrência.
De acordo com o Sindicato das Empresas do Transporte de
Passageiros (Sindpas/MG), o sistema regular de transporte de passageiros
acumulou prejuízo que ultrapassa 35% do serviço devido ao transporte ilegal,
que é aquele que ocorre sem autorização do Poder Público e é realizado por veículos
particulares, vans e ônibus que fazem linhas irregulares, sob o nome de
fretamento ou locação; e veículos de municípios destinados ao transporte
escolar ou de saúde, empregados para fins diversos. O sindicato denuncia que,
no Norte de Minas, por exemplo, empresas de vans, escondidas sob pretexto da
"carona solidária”, fazem o transporte de passageiros, oferecendo vagas nas
redes sociais.
Tudo seria encarado dentro da normalidade se o transporte
fosse gratuito. Todavia, não é isso que acontece, pois são cobrados valores
fixos de passageiros. Há condutores no Facebook que cobram dos juiz-foranos R$
40 para uma viagem ao município do Rio de Janeiro e entre R$ 20 e R$ 50 para a
capital mineira e outras cidades do estado. Conforme dados do Departamento de
Estrada de Rodagens de Minas Gerais (DER/MG), até o dia 31 de agosto deste ano,
em todo o estado foram aplicadas 11.383 multas e efetuadas 611 apreensões, em
4.502 ações de combate ao transporte irregular.
Para a Polícia Militar Rodoviária (PMR), motoristas e
passageiros devem pensar na segurança antes de optar pela "carona solidária”.
De acordo com o comandante do Grupo Tático da PMR, subtenente Júlio César de
Almeida, o condutor precisa saber quem vai no carro dele. "Em muitas ocasiões,
ele desconhece a índole da pessoa, se ela tem más intenções. Ele coloca em
risco a sua segurança e até de sua família quando leva alguém junto com
familiares”, afirma o policial, acrescentando: "É importante lembrar que,
quando esse motorista é abordado numa fiscalização e constata-se que ele está
recebendo algum tipo de vantagem para realizar o transporte, pode ter o veículo
apreendido e pagar multa”.
No caso do passageiro, o subtenente Almeida alerta que o
carona pode deparar-se com um motorista que não tem a prática de dirigir na
estrada. "Como não é profissional, não tem o curso específico para este fim,
colocando em risco a segurança dos ocupantes. Além disso, o automóvel pode não
ter passado por uma inspeção veicular adequada pelo DER ou pela Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). O melhor é que este tipo de prática
seja evitada.”
A Lei nº 19.445/11 pune esse transporte com apreensão do
veículo, multa de R$1.361,45 (dobrada na reincidência), além do pagamento de
taxas, despesas com transbordo dos passageiros, remoção e estada do veículo.
‘Economizo a metade
da passagem’, diz caroneira
Apesar da ilegalidade, os adeptos da "carona solidária” têm
outra visão sobre esta modalidade de transporte. Há um ano oferecendo vagas no
seu carro, um servidor público, de 37 anos, que mora na capital mineira, conta
que, além da economia, a experiência tem lhe rendido amizades e boas histórias
para contar. "Procuro dar carona para gente conhecida, porque não sabemos o que
o carona pode estar transportando. É um risco sim, sei das minhas
responsabilidades e dou manutenção periódica no veículo”, garante. Ele faz a
rota Juiz de Fora/Belo Horizonte/Juiz de Fora todo fim de semana, mas também
viaja para o Rio esporadicamente, sendo que pede a ajuda de R$ 50 para BH e R$
40 para o Rio.
O servidor admite que nunca enfrentou um momento de risco,
mas de tensão. "A PM do Rio me pediu que parasse na Linha Vermelha, e eu estava
com três caronas. Foi tenso, mas, graças a Deus, foi só uma abordagem de
praxe.” Ele relata que não sabe dizer o quanto economiza, mas, se não fosse
pelas caronas, não conseguiria vir para Juiz de Fora, onde mora sua família e
sua namorada, todos os finais de semana. "Não é propriamente uma atividade
lucrativa, mas ajuda bem. Deixo o pessoal em casa. Sai elas por elas. Não
lucro, mas também não saio no prejuízo”, conclui, acrescentando: "O pessoal
reclama dos ônibus demais. O preço é quase o dobro, e o tempo da viagem de
ônibus também é maior. Toda semana tem três, quatro na lista de espera. Meu
carro tem ar, ouço MPB, e eles adoram. Fiz amizades, tem sido uma experiência
incrível”, diverte-se.
Na opinião de quem senta no banco ao lado do motorista, a
praticidade e a economia falam mais alto. Uma mestranda da UFJF, de 24 anos,
pega carona pelas estradas desde a faculdade e, na maioria das vezes, com
pessoas desconhecidas. "Economizo a metade da passagem e nunca tive problemas e
nem uma situação de apuro”, comemora a estudante que faz as rotas Juiz de
Fora/Três Corações, Juiz de Fora/Rio, Juiz de Fora/Barbacena e Juiz de Fora/BH.
Quando questionada sobre os riscos, ela disse que não pensa neles. "Porque nos
grupos há sempre indicações e, quando há incidentes, costumam relatar por lá
mesmo. São pessoas que frequentemente dão carona e já fazem a rota há muito
tempo.”
Fiscalização e ações
educativas
O DER/MG informou que realiza ações rotineiras de
fiscalização no combate ao transporte irregular de passageiros em consonância à
Lei Estadual 19.445/2011, que proíbe qualquer tipo de transporte remunerado de
pessoas que não seja autorizado por ele ou pela Secretaria de Estado de
Transporte e Obras Públicas (Setop). O órgão ainda salientou que, por meio de
ações educativas, faz alertas dos perigos de quem faz a opção de realizar
viagens em veículos irregulares. Durante as abordagens, já foram flagrados
veículos com pneus deteriorados, manutenção precária, motoristas alcoolizados e
realizando tráfico de drogas e contrabando.
Já o Sindicato das Empresas do Transporte de Passageiros
(Sindpas/MG) afirmou que a realização de qualquer transporte remunerado depende
de prévia autorização do Poder Público. Logo, a prática de oferecer caronas
pagas trata-se de uma atividade ilegal.
Danos
Conforme o Sindpas, o transporte ilegal deve ser tratado
como ofensa a toda coletividade, pois prejudica a arrecadação de tributos,
reduz a oferta de empregos formais, provoca a decadência ou paralisação do
serviço público, causa prejuízos aos consumidores, fortalece o poder paralelo e
a prática de atividades criminosas conexas ao serviço, aparentemente inofensivo.
Quanto aos usuários das "caronas” pagas, o Sindpas afirma que é importante que reflitam sobre os riscos e danos irreversíveis que poderão sofrer, uma vez que colocam em risco a própria vida, já que nem sabem se terão assistência em caso de acidentes.