08/07/2013 07:22 - Valor Econômico
Financiar a compra de veículos deixou de ser o grande filão
dos bancos brasileiros. Nos cinco primeiros meses de 2013, o estoque de
financiamentos de veículos (R$ 192,1 bilhões) encolheu 0,6%. E vai continuar
caindo, na opinião de banqueiros com forte presença no segmento. A moderação
dos grandes bancos deu mais espaço aos bancos de montadora, que se mantiveram à
frente do mercado com 19,2% das operações de crédito em junho - 6 pontos
percentuais mais que em fevereiro. A liderança entre os bancos comerciais mudou
no último ano. Com 15,1% das concessões, o Santander passou para a segunda
posição. BV Financeira e Banco Pan (antigo PanAmericano), voltaram a ganhar
terreno.
Em um passado não tão distante, financiar a compra de
veículos era o grande filão do sistema financeiro brasileiro. Durante a última
década, a demanda reprimida da população pelo carro próprio fez a linha ganhar
magnitude nos balanços dos líderes do varejo bancário do país. É um passado que
ficou para trás. Nos cinco primeiros meses de 2013, o estoque de financiamentos
de veículos, em R$ 192,1 bilhões, encolheu 0,6%. E vai continuar caindo, na
opinião de executivos de bancos com forte presença no segmento.
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Se enganou quem pensava que uma melhora da inadimplência
aumentaria o interesse dos bancos em financiar veículos. Em maio, segundo dados
do Banco Central, a inadimplência das operações de crédito a veículos ficou em
6,3%, o mesmo nível de janeiro do ano passado. Desde julho do ano passado,
quando chegaram ao pico de 7,2%, os calotes na modalidade vêm diminuindo.
Por causa da retração dos grandes bancos no segmento, os
bancos de montadora ocuparam o espaço e atingiram, em junho, 19,2% das
operações de crédito para veículos leves originadas - avançando quase 6 pontos
percentuais desde fevereiro. Os dados levam em conta os gravames, registros das
garantias do crédito, feitos no período. São compilados pela Cetip e foram
obtidos pelo Valor com executivos do mercado.
"A participação substancialmente maior dos bancos de
montadora é explicada pelas promoções de "taxa zero"", afirma
Décio Carbonari, presidente da Associação Nacional das Empresas Financeiras das
Montadoras. Na "taxa zero", a montadora baixa artificialmente o juro
do crédito. É uma perda calculada para manter o mercado de veículos aquecido. E
a taxa, na prática, não é zero, já que o cliente arca com tarifas para
contratar o crédito.
Carbonari não acredita em aumentos ainda maiores na fatia
dos bancos de montadora nos próximos meses. Mas acredita que a frequência das
promoções com taxas de juros subsidiadas deve aumentar. Na visão dele, a
"taxa zero" ocupou o espaço de outras promoções feitas pelas
montadoras, como o ar-condicionado gratuito ou a isenção de IPVA, na
preferência de quem compra carros.
Entre os bancos comerciais, tanto públicos como privados, os
últimos doze meses trouxeram reconfigurações entre as lideranças do mercado. O
Itaú Unibanco, que era o segundo maior da modalidade em junho do ano passado,
perdeu a posição para o Santander, considerando os veículos leves, tanto novos
como usados. O Banco do Brasil, que no ano passado disparou em participação de
mercado, também perdeu fôlego. Já dois nomes que andavam sumidos do mercado, a
BV Financeira e o Banco Pan (antigo PanAmericano), voltaram a ganhar espaço. No
caso da BV, seu avanço compensa em parte a perda de mercado do BB, um dos seus
controladores.
O Santander, em junho de 2012, foi responsável por 12,3% das
operações de crédito de veículos. Um ano depois, a fatia ficou em 15,1%. Além
de um ganho na participação no mercado de usados, o banco se beneficiou do
sucesso de vendas do HB20, o carro compacto lançado pela Hyundai no fim do ano
passado. Em agosto do ano passado, o banco espanhol e a montadora criaram uma
financeira em conjunto.
"Mais importante que volume originado, as operações com
montadora trazem mais qualidade para a carteira", afirma Luis Felix
Cardamone, vice-presidente executivo de varejo do Santander. "A
inadimplência das operações de montadora chega a ser menos da metade dos demais
créditos em algumas situações."
Cardamone projeta que apenas entre a segunda metade de 2014
e o começo de 2015 é que a carteira de crédito de veículos do mercado
finalmente voltará a crescer consistentemente, com as novas operações superando
as amortizações. Neste ano, afirma o executivo, ainda estão vencendo muitas das
operações do período de 2010 e 2011, com prazos de até 70 meses e sem exigência
de entrada, que têm dado dor de cabeça aos bancos que se aventuraram a
originá-las.
Tentando deixar o passado para trás, o Banco Pan ficou mais
agressivo no crédito de veículos no último ano. O banco saiu de 3,2% das
originações em junho de 2012 para 5,6% um ano depois. "Ocupamos
integralmente o espaço que era do HSBC ", afirma Sérgio Antônio Cipovicci,
superintendente de veículos. O Pan contratou boa parte da equipe da antiga
financeira do HSBC, incluindo Cipovicci, depois que o banco britânico decidiu
focar nos clientes alta renda.
"O que projetamos no orçamento é um volume de
originação estável daqui para frente", afirma o executivo, que tenta
conquistar a preferência entre concessionárias, o que ajuda a receber antes as
propostas dos melhores clientes.
Em junho do ano passado, no auge do programa Bom Pra Todos
(que cortou em 37% as taxas de juros do financiamento de veículos), o BB
contava com 14,4% de participação nos desembolsos para veículos novos - focando
exclusivamente no canal agência. Um ano depois, caiu para 5,8%. O banco, porém,
não se surpreendeu com a queda.
"Em 2012, saímos de um patamar de originação inferior a
1% do mercado para cerca de 12%. Em um segundo momento, após a readequação das
taxas pelos demais bancos, esperávamos aumento da concorrência e estabilização
do ritmo de originação em um patamar diferente, mas com a manutenção de um
índice de inadimplência muito reduzido, inferior a 1%", afirma o diretor
de empréstimos e financiamentos, Edmar Casalatina.
O BB é um dos poucos bancos ainda a dar crédito de veículos sem entrada e com 60 meses, o que tem alongado a duração da carteira do banco. O que diminui o risco das operações é que elas só são feitas em agências, com correntistas do banco.
Bancos mudam estratégia de atuação no segmento
Para Cardamone, do Santander, entrada é crucial em crédito para carros usados
Prazos menores de financiamento, maior exigência de
informações dos potenciais tomadores, bancos preferindo emprestar apenas para
seus correntistas e pressão no mercado de carros usados. São essas apenas
algumas das consequências da reorganização pela qual passou o crédito de
veículos no Brasil, desde 2011, quando a inadimplência na modalidade disparou.
As mudanças nas estratégias dos bancos para estes empréstimos persistem mesmo
agora, quando os calotes voltaram a cair.
Em maio de 2013, o prazo médio de financiamento de veículos
leves era de 36 meses, mesmo nível de abril, ante 41 meses um ano antes.
"Os prazos não devem cair mais", afirma Iroilton Medeiros, da unidade
de financiamentos da Cetip. Para o executivo, além de prazos menores e maior
exigência de entrada, os bancos adaptaram seus modelos de crédito para exigir
mais formalidade de potenciais tomadores, exigindo mais comprovação de renda,
por exemplo.
"Não vamos ver por um bom tempo ciclo favorável no
crédito a veículos", afirma Dominique Signora, diretor geral do RCI
Brasil, banco das montadoras Renault e Nissan. Segundo ele, isso deve fazer com
que os bancos de montadoras sigam sustentando o mercado. O desafio é fazer isso
sem deteriorar a qualidade da carteira. No caso do RCI, a inadimplência acima
de 90 dias foi de 1,11% em abril, ante 0,96% na média de 2012.
Se as taxas de juros subsidiadas dos bancos de montadora
fizeram com que liderassem o crédito nas concessionárias, a estratégia de
alguns bancos tem sido aumentar a fatia de crédito originada em agências. Caso,
por exemplo, do Itaú Unibanco e do Bradesco. Desde junho do ano passado, os
dois bancos perderam mercado em termos de originação. O Itaú foi de 15,1% em
junho de 2012 para 13,1% no mesmo mês de 2013. O Bradesco foi de 14,5% para
13,3%.
Contudo, nos dois bancos a fatia de mercado considerando
apenas o crédito concedido em agências cresceu, em especial nos veículos
usados. Ou seja, uma parte do fluxo de pessoas que não encontrou crédito na
concessionária, pode ter conseguido empréstimo ao procurar a instituição onde é
correntista.
Especificamente no mercado de usados, dois nomes
tradicionais do segmento recuperaram uma parte do espaço perdido em meses
recentes: a BV Financeira e o Santander. A BV lidera o mercado, em termos de
originações com 22,5% do total. O Santander, em segundo, tem 20%. Bradesco e
Itaú têm 13,4% e 13,3%, respectivamente.
O próprio Santander reconhece que operar nesse segmento
requer um conhecimento - e todo um aparato estatístico - bem específicos.
Graças às sucessivas reduções de imposto para compra de carros novos, o valor
do veículo usado despencou nos últimos anos. Para se proteger dessa variação,
uma das ferramentas do Santander é aumentar o valor da entrada, criando um
"colchão" para a operação, afirma Felix Cardamone.
Em 12 meses, as vendas financiadas de carros usados caíram.
Em junho de 2012, eram financiadas 31% das vendas. Um ano depois, o percentual
caiu a 27%.