10/03/2014 07:33 - O Estado de SP
Na tentativa de preservar o que resta das áreas verdes
públicas e particulares da cidade, o novo Plano Diretor de São Paulo pretende
recriar, após 12 anos, uma zona rural com regras de adensamento mais
restritivas em praticamente um quarto do território paulistano. Também quer
permitir a transferência de potencial construtivo de terrenos arborizados que
podem virar parques e propõe o pagamento em dinheiro aos donos de propriedades
que prestam serviços ambientais ao Município.
As propostas estão no substitutivo que o relator do Plano
Diretor, vereador Nabil Bonduki (PT), vai apresentar nesta semana à Câmara
Municipal. A expectativa é de que o projeto de revisão da lei que dita as
regras do uso e ocupação do solo em toda a cidade seja votado antes do início
da Copa do Mundo, em junho. A versão original foi enviada ao Legislativo em
setembro pelo prefeito Fernando Haddad (PT).
A ideia de recriação da zona rural, extinta pelo plano
vigente aprovado em 2002 na gestão Marta Suplicy (PT), é limitar o parcelamento
do solo em uma área de 219 km² nos distritos de Parelheiros, Grajaú e Marsilac,
extremo da zona sul da capital. Com cerca de 27 mil moradores, ela fica
majoritariamente nas Áreas de Proteção Ambiental (APAs) Capivari e Bororé, mas
inclui franjas onde há atividades urbanas permitidas pela lei atual.
Ao transformar todo esse território em zona rural, a
exigência mínima para loteamento de terrenos sobe dos atuais 7,5 mil m² para 20
mil m². "A ideia do substitutivo é conter a expansão horizontal da cidade
e fazer essas áreas serem melhor utilizadas, criando emprego e renda com
atividades que garantam a preservação do meio ambiente, como a agricultura
orgânica e o ecoturismo", disse Bonduki.
Segundo o cadastro da supervisão de abastecimento da
Prefeitura de São Paulo, há hoje na região 316 propriedades rurais. A ideia é
que a localidade receba, por exemplo, novos produtores de alimentos e
hotéis-fazenda, levando emprego sem comprometer o ecossistema no local, que
concentra os afluentes da Represa do Guarapiranga, responsável pelo
abastecimento de água para 20% da Região Metropolitana de São Paulo.
"Esse é o conceito de zona rural moderna. Além das
atividades estritamente rurais, você permite a exploração sustentável da
terra", disse Bonduki. Somando os 226 km² de parques já existentes na
cidade, como Cantareira e Jaraguá, na zona norte, e Serra do Mar, zona sul,
onde não há moradias e são permitidos apenas atividades de pesquisa, educação e
turismo, a nova zona rural compreenderá quase 30% de todo território paulistano
e menos de 1% da população.
O substitutivo também cria uma nova macroárea chamada
Controle e Qualificação Urbana e Ambiental, que compreende distritos altamente
adensados dentro da macrozona de preservação. A maioria deles fica na zona sul,
como Cidade Dutra, Jardim Ângela e Socorro, também em áreas de mananciais. Lá,
o parcelamento do solo continuará sendo a partir de 250 m², mas, segundo o
relator do Plano Diretor, haverá restrições nas regras para novas construções
para aumentar a permeabilidade do solo.
Ambiente."Um grande avanço do substitutivo é incorporar no Plano Diretor as diretrizes da Política de Mudanças Climáticas aprovada tanto no Estado como no Município", disse Bonduki. Segundo ele, a essência de todo o projeto é reequilibrar o desenvolvimento da cidade, que viu o centro expandido perder 500 mil habitantes nos últimos 20 anos, enquanto que o crescimento se deu na periferia carente de infraestrutura.
Proposta prevê que
Prefeitura pague dono por preservação
Outra novidade apresentada no substitutivo do Plano Diretor
é a criação de dois instrumentos de incentivo financeiro que podem permitir a
preservação de áreas verdes privadas. A proposta lista 90 terrenos que passarão
a ser Zonas Especiais de Proteção Ambiental (Zepam), totalizando 158 áreas onde
há projetos para construção de parques públicos. São 82 km² de áreas verdes -
atualmente só 68 são Zepam -, praticamente o dobro dos 42 km² de área dos
parques atuais na cidade.
Hoje, para tornar uma área particular parque a Prefeitura
precisa comprar o terreno do proprietário, mas quase nunca há dinheiro para
fazê-lo. Dos 78 Decretos de Utilidade Pública (DUPs), a administração realizou
apenas 12 depósitos. Um caso emblemático é o do Parque Augusta, na região da
Paulista, cujo custo da desapropriação é estimado em R$ 70 milhões.
Para suprir a falta de recursos públicos, o novo Plano
Diretor prevê duas medidas para estimular a manutenção da vegetação. Na chamada
macrozona de proteção e recuperação ambiental, que pega os extremos das quatro
zonas da cidade, como Parelheiros, na sul, a Prefeitura vai pagar em dinheiro
pela prestação de serviços ambientais aos proprietários que preservarem o
ecossistema dentro da propriedade.
Segundo o vereador Nabil Bonduki (PT), relator do Plano
Diretor, a fórmula que vai calcular o valor a ser pago pela Prefeitura está
sendo concluída e constará do substitutivo que será apresentado nesta semana na
Câmara Municipal. "Vamos dar estímulo financeiro, não só com isenção
tributária, para que essas pessoas mantenham suas áreas intactas de modo a
evitar que haja uma devastação e o consequente impacto no meio ambiente",
disse.
Já na chamada macrozona de estruturação e qualificação
urbana, que compreende o centro expandido e seu entorno, será aplicado o
instrumento de transferência de potencial construtivo. Na prática, o dono de
uma Zepam poderá negociar no mercado imobiliário o estoque virtual da metragem
que seria possível construir no seu terreno para uma construtora utilizá-lo
para erguer uma torre acima do limite básico - em outro local onde a Prefeitura
pretende incentivar o adensamento.
Um exemplo é o da proposta de criação do Parque da Fonte, uma área de 37 mil m² no Butantã, zona oeste da capital. Já há um DUP do local, mas a prefeitura não tem dinheiro para desapropriar o terreno. Ao ser enquadrado como Zepam, o dono da área pode transferir o potencial construtivo da área e mantê-la para sempre preservada ou doá-la para a administração. Segundo Bonduki, no caso de doação, o valor do papel do potencial construtivo é maior.