É comum que, na frente dos hospitais de Curitiba, cidadãos
sejam abordados por pessoas que entregam cartões de visita e oferecem ajuda na
liberação do DPVAT, o seguro obrigatório para indenizar vítimas de acidentes de
trânsito. Apesar de a assistência não ser ilegal, seguradoras garantem: o
processo de indenização é simples e não exige contratação de intermediadores. A
situação muda de figura quando o seguro é negado ou cancelado.
Como o processo para liberação do benefício não é judicial,
mas administrativo, há diversos profissionais oferecendo o serviço –
contadores, despachantes e escritórios de assistência jurídica. As seguradoras
vêm tentando ganhar terreno com campanhas como a do Sindicato dos Corretores e
Empresas de Seguros do Paraná (Sincor-PR). Nos últimos meses, a entidade
distribuiu banners e panfletos em hospitais do estado.
As campanhas tentam coibir a atuação de profissionais que
cobram honorários para prestar atendimento similar ao que outros órgãos, entre
eles o sindicato, oferecem gratuitamente. "O problema é que o intermediário
cobra caro; chega a 25%, 30% do valor a ser recebido pelos beneficiários. Tendo
os documentos em mãos, o sindicato faz o mesmo serviço e não cobra nem pelas
fotocópias”, diz Luiz Carlos Moscardini, responsável pelo setor de DPVAT do
Sincor-PR.
Com base nessas campanhas, a seguradora Líder, que
administra o seguro no país, informa que o pagamento de indenizações vem
crescendo – pelo menos em número, já que não cita valores. Entre 2011 e 2013, a
quantidade de indenizações pagas aumentou 73% e chegou perto de 634 mil. No
caso das indenizações por morte, houve queda de 6% no período, que a Líder
credita a uma redução da violência no trânsito.
Justiça
Isso não significa, porém, que o serviço não seja alvo de
reclamações. De acordo com a Superintendência de Seguros Privados (Susep), que
fiscaliza o setor, das 3,8 mil denúncias recebidas pelo órgão em 2013, 55% se
referiam a valores considerados baixos, especialmente os para reembolso de
despesas médicas.
A Líder diz não ter interesse em informar números
relacionados à judicialização de processos. "A negativa de cobertura é rara”,
argumenta a assessora institucional da companhia, Angela Amparo. As ações,
porém, existem, a ponto de o Judiciário promover mutirões de conciliação com a
seguradora para desafogar processos.
Em um caso emblemático em 2012, o Superior Tribunal de
Justiça decidiu que o passageiro que cai ao descer de um ônibus é coberto pelo
seguro – o inverso do que dois tribunais e a seguradora haviam julgado
anteriormente.
Proposta
Valor de indenização é questionado por projeto de lei na Câmara
Desde 2006 o valor máximo de indenização a ser pago pelo
DPVAT é R$ 13,5 mil. Os valores são instituídos por medidas provisórias que
alteram periodicamente a lei do seguro, que é de 1974. O máximo em geral é pago
quando a vítima morre ou fica inválida. O teto para despesas médicas é R$ 2,7
mil.
O projeto de lei 4.393 tramita na Câmara dos Deputados
propondo a correção dos valores pela inflação. A proposta está pronta para
votação no plenário, mas não anda desde 2012. Na casa, há ainda projetos
pedindo tanto a extinção do seguro obrigatório quanto o remanejamento de
recursos arrecadados para que cheguem aos estados.
Dificuldade
O ex-vendedor autônomo Silvio Alano de Souza, 45 anos,
sofreu um acidente em 2013 na BR-163, em Toledo. Por ter perdido parte da
mobilidade das pernas, achou que receberia perto do teto, mas foi compensado
com R$ 6,7 mil (R$ 300 menos que o declarado pela perícia). "Estou
insatisfeito, mas não procurei a Justiça porque o custo dos honorários pode não
compensar”, diz ele, que vive em Foz do Iguaçu.
O assunto divide especialistas em Direito do Consumidor.
Para o advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Webert
Costa, apelar à Justiça tem se mostrado uma opção quando a responsabilidade
pelo acidente é provada, ainda mais se parte de uma pessoa jurídica.
Já Ivan de Oliveira Silva, autor de um livro em que defende
que, pela Constituição, o DPVAT deve ser regido pelo Código de Defesa do
Consumidor, o Judiciário caminha para analisar caso a caso. "O DPVAT é um
seguro de vida, não de patrimônio”, diz. Para Silva, isso equivale a dizer que
o seguro também está apto a cobrir danos morais, por exemplo. (CBC)