STF realiza audiência de conciliação entre Lamsa e prefeitura do Rio sobre disputa pela Linha Amarela

05/04/2021 06:40 - O Globo

RIO — A disputa entre a concessionária Lamsa e a prefeitura do Rio para administrar a Linha Amarela, com o pedágio suspenso desde setembro passado, tem mais um capítulo nesta segunda-feira, dia 5. Na tentativa de um acordo, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luiz Fux, promove mais uma audiência de conciliação, a segunda em um mês. O município vem defendendo que haja uma redução de tarifa, por considerar o valor atual excessivo (R$ 7,50 em cada sentido), enquanto a empresa tem alegado que existe um contrato de concessão que precisa ser cumprido por questão de segurança jurídica.

Se não houver consenso, a tendência é que a cobrança do pedágio continue suspensa devido a outras ações que tramitam numa batalha jurídica em Brasília e no Rio. Por enquanto, nos autos, a posição de Fux é que, sem um acordo, a decisão final será tomada pelo plenário do STF.

No Supremo, a discussão não é propriamente se o ex-prefeito Marcelo Crivella cumpriu os ritos legais para encampar a via expressa e extinguir a concessão — com validade até 2038 pelo contrato atual —, mas se o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tinha competência legal para interferir nesse processo. No ano passado, a pedido da prefeitura, o presidente do STJ, ministro Humberto Martins, derrubou duas liminares da Justiça do Rio favoráveis à concessionária e à cobrança do pedágio, o que até hoje não foi debatida pelos outros integrantes da corte. Com base nessa decisão do STJ que a prefeitura operou a via, sem pedágio, entre setembro de 2020 e o mês passado, quando a Lamsa reassumiu a Linha Amarela, mas ainda sem cobrar a tarifa dos motoristas.

Choque de argumentos

A Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), que representa as operadoras do setor, no entanto, apresentou uma reclamação ao STF questionando a competência do STJ. A tese da ABCR é que a discussão envolveria matéria constitucional, o que só compete ao STF. Entre os argumentos da entidade — aceitos por Fux, que suspendeu a decisão do colega do STJ — está a defesa de que a prefeitura só poderia extinguir a concessão depois que operadores atuais fossem indenizados de forma prévia e em dinheiro, como previsto na Constituição Federal. Ao tomar sua decisão, Fux entendeu e que a liminar do STJ trazia riscos de lesar a ordem pública.

Na Justiça do Rio, porém, o processo que discute a indenização ainda corre em primeira instância, ou seja, não foi arbitrado e pago qualquer valor de indenização. Nesse processo, sequer foi nomeado um perito judicial que vai estimar quanto a concessionária teria direito a receber. Ao iniciar a disputa com a Lamsa, o ex-prefeito Marcelo Crivella sustentou que não teria que realizar esses pagamentos devido ao que a concessionária arrecadou nos últimos anos. No entanto, em juízo, a prefeitura ofereceu como garantia de que vai honrar a dívida 20 imóveis avaliados em R$ 1,4 bilhão. Na lista estão a Cidade das Artes (Barra da Tijuca), a casa onde morou o senador Afonso Arinos (Botafogo) e as sedes do Instituto Pereira Passos (Laranjeiras) e da Rio Urbe (Humaitá).

Em tese, a decisão de Fux que suspendeu os efeitos do pronunciamento do STJ, em 3 de março, já permitiria que a Lamsa voltasse a cobrar o pedágio. A concessionária chegou a anunciar a retomada da cobrança, mas voltou atrás depois de, em 9 de março, um decreto do prefeito Eduardo Paes determinar que a medida só poderia ocorrer após uma decisão final do STF. Esse decreto de Paes também é alvo de ações na Justiça.

Procurada, a Lamsa preferiu não se manifestar. Nos autos, a concessionária sustenta que cumpriu todas as cláusulas previstas no contrato, investindo em melhorias na infraestrutura, como a construção de novo acesso em Jacarepaguá e uma complementação da via interligando a Linha Amarela à Linha Vermelha. Além disso, afirma que a suspensão da cobrança do pedágio, que dura sete meses, fez a concessionária acumular dívidas, deixando caótica a situação de suas contas. A estimativa é que a Lamsa deixe de arrecadar R$ 1 milhão por dia sem a exploração da via. A concessionária defende ainda que, se a prefeitura quiser encampar o contrato, tem esse direito, desde que seja arbitrada uma indenização prévia pelo encerramento antecipado.

Já o prefeito Eduardo Paes diz que o desejo da prefeitura não é “encampar por encampar”. Caso se recorra ao instrumento, ele pretende relicitar a operação da via expressa. A busca, segundo ele, é por um valor justo da tarifa:

— Estudos da prefeitura mostram que uma tarifa de R$ 2 a R$ 3 é suficiente para garantir a operação da via e a taxa de retorno da concessionária. Disse na eleição que sou a favor de cobrança de pedágio. Só não pode ser esse absurdo. Concessões preveem reequilíbrios que tanto podem ser para aumentar ou diminuir a tarifa. Desde 2015 tentamos o reequilíbrio com a Lamsa, que simplesmente se recusa a aceitar qualquer proposta. Insegurança jurídica é trazida por uma tarifa absurda. Respeitamos contratos e concessões.

Como o imbróglio se instalou

20 de dezembro de 2018

Decreto do ex-prefeito Marcelo Crivella suspende cobrança do pedágio, alegando que a concessionária Lamsa teria arrecadado R$ 223,9 milhões de forma indevida. Dias depois, Lamsa reassume a operação, por decisão da Justiça do Rio, em idas e vindas que seguiriam pelos meses seguintes.

22 de julho de 2019

Prefeitura divulga resultado de nova sindicância na qual afirma que o prejuízo com a concessão chegaria a R$ 1,4 bilhão. A Lamsa contesta.

28 de outubro de 2019

Prefeitura usa retroescavadeiras para derrubar cancelas da praça do pedágio, mas Justiça Estadual determina que, dias mais tarde, a Lamsa retome a cobrança.

5 de novembro de 2019

Câmara dos Vereadores aprova autorização para encampar a via expressa. No dia seguinte, Crivella sanciona a lei que autoriza a medida. Cancelas são liberadas, mas nova decisão na Justiça Estadual restabelece o pedágio.

16 de setembro de 2020

Ministro Humberto Martins, do STJ, derruba liminares da Justiça Estadual que impediam a prefeitura de assumir a operação da via. A cobrança do pedágio é suspensa.

21 de outubro de 2020

Plenário do STJ se reúne para discutir a matéria, mas ministro João Otávio de Noronha pede vistas. O tema não voltou à pauta.

27 de janeiro de 2021

Já na gestão do atual prefeito, Eduardo Paes, liminar da Justiça do Rio dá prazo para que a prefeitura assuma em definitivo a operação da via em 30 dias ou que a Lamsa retome a cobrança de pedágio.

19 de fevereiro de 2021

Prefeitura do Rio informa à Lamsa que iniciará o processo de encampação da via no dia 21.

3 de março de 2021

Ministro Luiz Fux, presidente do STF, aceita pedido da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias e suspende decisão do STJ que autorizava a continuidade da encampação. Voltam a valer decisões da Justiça Estadual. Dois dias depois, Lamsa reassume a operação, anunciando que o pedágio voltaria a ser cobrado no dia 13 de março.

9 de março de 2021

Decreto de Paes desautoriza a cobrança do pedágio enquanto não houver decisão do STF.

16 de março de 2021

Primeira audiência de conciliação no STF termina sem acordo.