Transporte não é alface - Ely José de Mattos

10/03/2018 08:08 - Gaúcha ZH

Já faz algum tempo que o transporte público em Porto Alegre vem se deteriorando. Na atual gestão municipal, esta questão tem tomado ainda maior proporção em função de duas crises: das contas públicas e da Carris. A movimentação na Capital oferece um elenco de transtornos diários, que incluem ônibus sucateados, descumprimento de tabela horária e passagem cara.

Quando cobrada, a prefeitura diz que a Carris está quebrada e que uma boa solução seria vendê-la. Já as concessionárias, empresas privadas, afirmam que as isenções de passagens, a queda no número de usuários e a inadequação da oferta à demanda são problemas graves. Aliás, a redução nas isenções foi aprovada na sexta-feira pelo Conselho Municipal de Transportes Urbanos.

Acontece que qualquer discussão de soluções para o problema implica entender o serviço em questão. O transporte coletivo é um serviço público. Não podemos tratá-lo como uma alface, que a qualidade e o preço oscilam de acordo com a safra e ninguém sofre muito com isso. O transporte é um serviço de esfera de alcance diferente. E ele é público porque oferece o que nós economistas chamamos de externalidades positivas, que são efeitos indiretos sobre os quais há interesse social.

Transporte coletivo tem papel fundamental na organização da cidade e no bem-estar das pessoas. Quando bem instalado, atua na redução da circulação de automóveis, na diminuição da poluição e no aumento da produtividade do trabalhador, por exemplo. E só é possível controlar e atingir bons níveis desses efeitos com a presença do Estado.

A atuação do governo não precisa se restringir à regulação. É bastante razoável a existência de subsídios para que o transporte coletivo funcione bem e potencialize suas externalidades positivas sobre a sociedade. Só que, hoje, subsídio virou palavrão. É como se fosse caridade que só gerasse ineficiência. Mas, não é – pelo menos no que toca ao transporte público.

Basta quantificarmos os benefícios das externalidades sociais. Uma empresa privada não faz isso, pois estes efeitos indiretos não têm remuneração. Mas, como sociedade, precisamos responder: qual o valor de ter uma cidade mais organizada, limpa, silenciosa e com opções de chegar em casa com mais rapidez, segurança e conforto? A resposta indica a necessidade ou não de subsídio. Faça sua conta.

Ely José de Mattos - Economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS