Formas de queima de
combustível e de injeção nos cilindros fizeram com que veículos não tivessem
rendimento adequado. Hoje indústria diz que problemas foram revertidos
ADAMO BAZANI
O
leitor do Blog
Ponto de Ônibus, Jair Seidl, contribuiu com uma foto que revela uma
página interessante da história dos transportes na cidade de São Paulo: a
presença de uma frota de ônibus a gás natural. Aliás, é uma história que pode
ser projetada para o futuro.
Comuns
atualmente em parte da Europa , Ásia e América do Norte, com tecnologia mais
avançada dos que os veículos que rodaram em São Paulo, os ônibus a GNV são
vistos como alternativas de baixo custo para redução das emissões de poluentes
na operação dos transportes coletivos.
Na
imagem, a placa localizada no acesso ao túnel sob o Rio Pinheiros, para os
veículos que têm origem na Avenida Juscelino Kubitscheck, zona Sul de São
Paulo, indica a proibição de os veículos pesados acessarem este túnel, com
exceção dos ônibus a gás natural. A liberação para este tipo de ônibus era
justamente pelo fato de serem menos poluentes.
Diversas
linhas na cidade tiveram ônibus GNV. Como ocorreu com outras tecnologias menos
poluentes e alternativas ao óleo diesel, foi a CMTC – Companhia Municipal de
Transportes Coletivos, empresa pública, a responsável pela expansão da frota de
ônibus a Gás Natural na cidade nos anos de 1980.
Mas
os estudos começaram antes, nos final de década anterior. Foram testes de
laboratórios, em ônibus-modelos para que São Paulo tivesse uma frota mais
limpa.
LEIS E DESENVOLVIMENTO DA
FROTA:
Tanto
nos planos nacional e local, um conjunto de leis e regulamentações, muitas
revogadas posteriormente, demonstrava um esforço para fazer com que o ônibus
GNV pegasse.
É
fato que as "canetadas” para assinar as normas eram mais rápidas que os
estudos, incentivos e até mesmo que o bom senso para as limitações da ocasião.
Mas não se pode negar o avanço que a época pós-crise do petróleo de 1974
significou em estudos para combustíveis mais limpos e mais baratos que produtos
com maior refino, como a gasolina e o diesel.
Em
28 de agosto de 1982, o Conselho Nacional de Transportes publicou uma decisão
que obrigava as grandes cidades desenvolverem em parcerias com empresas e mundo
acadêmico projetos para o GNV em ônibus.
São
Paulo já desenvolvia parcerias antes desta resolução, tanto é que no ano de
1983, após um convênio entre Instituto de Pesquisas Tecnológicas, Sabesp, CMTC
e Mercedes Benz, circulava na cidade de São Paulo o primeiro lote de ônibus a
gás natural.
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Nos
anos de 1980, a Mercedes-Benz do Brasil desenvolveu um chassi não adaptado, mas
próprio para tração a GNV. Era uma versão do OH 1315, de motor traseiro.
Apesar
de não seguir com a velocidade adequada, chamava a atenção a implantação de
ônibus a gás em sistemas brasileiros, com destaque para São Paulo que na época
recebeu delegações de diversas partes do mundo
Em
1º de janeiro de 1991, a então prefeita Luiza Erundina assinava a Lei Municipal
10.950, que determinava que em 10 anos, ou seja, em 2001, a frota paulistana de
ônibus diesel fosse toda substituída por GNV. A exemplo da Lei de Mudanças
Climáticas, assinada em 2009 e que determina que toda a frota de ônibus de São
Paulo não dependa de diesel a partir de 2018, a determinação de Erundina não
avançou.
Em
13 de agosto de 1991, a CMTC inaugurava o primeiro serviço exclusivamente com ônibus a gás natural. Era a linha 209 –
Estações, que circulava pelo centro da cidade. Só que na época, quem pensou que
o GNV seria o principal meio de abastecimento dos ônibus de São Paulo se
iludiu. De acordo com levantamento feito pela Comgás, o número máximo alcançado
de ônibus com este combustível foi em meados de 1990, quando circulavam, dos
mais de 12 mil coletivos do sistema municipal na época, apenas 250 veículos.
Além da CMTC, que foi privatizada entre 1993 e 1994, operaram ônibus a gás,
empresas como Viações Gatusa, Santa Madalena e a CCTC – Cooperativa de
Transportes Coletivos, famosa pelos seus monoblocos O 371 que circulavam pela avenida
Paulista e centro da Capital, operando na linha avenidas.
De
acordo com dados levantados pelo pesquisador José Euvilásio, do site Circular
Avenidas, por causa da privatização da CMTC, a CCTC – Cooperativa de
Transportes Coletivos ganhou uma das licitações das linhas da empresa pública
correspondente ao lote 66, na época. Entre as ligações estavam trajetos que
eram operados por ônibus a gás. A CCTC era formada majoritariamente por
ex-funcionários da CMTC.
Como
a cooperativa não tinha frota própria, ela assumiu os ônibus que eram da CMTC,
entre eles os "barulhentos” O-371, que marcaram as linhas Avenidas.
Em
1998, a CCTC comprou veículos zero-quilômetro, entre os quais, movidos a GNV.
Na
mesa época, as empresas Gatusa e Santa Madalena também tinham frotas a gás
natural, modelos Mercedes-Benz OH1621L que eram a diesel e foram convertidos.
Já o modelo OH1623LG vinha já de fábrica original para ser movido a GNV.
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No
entanto, com o tempo, o abastecimento precário, ainda feito de maneira
mecânica, a queima pouco eficiente e também a pouca disponibilidade do combustível
para o tamanho da frota desestimularam o avanço dos ônibus a GNV, que
apresentavam perda de desempenho.
Em
2002, quando a CCTC já tinha encerrado as atividades, os ônibus a GNV foram
abandonados em pátios que eram da CMTC. Os veículos a gás da Santa Madalena e
da Gatusa tinham sido convertidos para óleo diesel. Alguns foram vendidos para
o sistema de Curitiba.
Após
a licitação dos transportes em 2003, na época da prefeita Marta Suplicy, apenas
dois ônibus GNV operavam em São Paulo: Caio Millennium MBB OH1623LG. Os
veículos pertenciam à Sambaíba Transportes Urbanos.
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ÔNIBUS A GNV EM SÃO PAULO
DARIA CERTO ATUALMENTE?
Diante
de tentativas mal sucedidas de permanência de ônibus a GNV em São Paulo, será
que a possibilidade de a cidade ter também o gás natural entre as matrizes
energéticas para o transporte coletivo foi descartada completamente?
A
resposta é não.
Entre
julho e agosto de 2015, a Scania testou em São Paulo um ônibus fabricado na
Suécia, movido com GNV.
Segundo
a montadora, com base em medições feitas pela Netz Engenharia Automotiva, o
custo por quilômetro percorrido foi 28% menor que o de um ônibus comum a óleo
diesel nos mesmos percursos, correspondentes a duas linhas do sistema
municipal. Os testes foram por 700 quilômetros. O cálculo da operação a diesel
também contabilizou os gastos com o Arla 32 – Agente Redutor Líquido
Automotivo, usado para que os motores a diesel atendam à norma nacional
Proconve P7, com base no padrão Euro V, de redução de emissões.
Foi
feita a "operação espelho”, com um ônibus a diesel de padrões semelhantes
seguindo junto.
O
modelo a GNV usado nos testes foi importado. Trata-se de um Scania Citiwide –
Euro 6, de 15 metros de comprimento e três eixos, K 280 – 6X2 *4 – DC 09 280,
com chassi e motor feitos na Suécia e a carroceria na Polônia pela própria
Scania.
A
Scania estuda fabricar o modelo no Brasil. O veículo opera tanto com gás
natural como biometano, combustível obtido a partir da decomposição do lixo.
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A
montadora sueca com sede brasileira em São Bernardo do Campo, fez ao menos oito
demonstrações no País do modelo, três com biometano e cinco com gás natural.
O
Blog Ponto de Ônibus acompanhou no final de janeiro deste ano, a apresentação
realizada com biometano em Triunfo, no parque da Brasken, no Rio Grande do Sul.
Foi uma parceria entre Companhia de Gás do Estado do Rio Grande do Sul
(Sulgás), Braskem e Consórcio Verde Brasil (Ecocitrus e Naturovos). O gás foi
obtido de restos de plantações e de dejetos de aves.
Na
ocasião, o diretor de vendas de ônibus da Scania, Silvio Munhoz, disse que os
problemas de perda de potência e rendimento dos coletivos a gás natural ficaram
no passado. Hoje na Europa, uma parcela significativa de ônibus é a GNV.
Ele
explicou que está na tecnologia de queima do combustível e no abastecimento, a
grande diferença para que hoje os ônibus a gás não tenham os mesmos problemas
que ainda assustam empresários e poder público.
"O
que ocorreu com estes ônibus mais antigos era que eles tinham injeção mecânica.
O que dá desempenho é a queima do metano. A fábrica, antigamente, fazia uma
regulagem para o combustível, mas por diversos fatores, na hora da injeção, não
vinha a quantidade de metano necessária para a queima. Já no sistema de injeção
eletrônica, esta quantidade correta é regulada na hora por softwares. Há sondas
na entrada e na saída do gás que enviam a mensagem para o motor que corrige na
hora a quantidade de metano a ser queimada. Além disso, a distribuição era por
carretas. Nem todo o gás dos cilindros das carretas eram aproveitados e o tempo
de abastecimento era muito longo. Hoje em três minutos você enche um tanque de
ônibus com gás. Um ônibus a diesel demora de um minuto e meio a dois” –
explicou.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes