O Teletrabalho como política pública estratégica para reduzir emissões atmosféricas

10/02/2018 10:00 - Olimpio Alvares


Desde a década dos anos noventa, o Teletrabalho é uma das principais estratégias entre as políticas públicas para supressão de deslocamentos motorizados individuais potencialmente desnecessários, sujos e onerosos. Em alguns países, esse fenômeno é o principal "drive" que resulta sistematicamente em leis e programas compulsórios de "Teletrabalho Mínimo" em empresas públicas e privadas, com o objetivo maior de reduzir o impacto ambiental da mobilidade urbana motorizada e insustentável.

A ideia central é suprimir parcialmente congestionamentos, consumo de combustíveis tóxicos, poluição do ar e emissões de gases do efeito estufa - entre outros muitos benefícios tangíveis (quantitativos, facilmente contabilizáveis) e intangíveis (qualitativos) - todos absolutamente relevantes para empresas, empregados e o bem-estar da comunidade.

O Estado da Carolina do Sul nos Estados Unidos, por exemplo, optou por publicar sua lei obrigando as empresas de governo a reduzirem a quilometragem corporativa (hardcommuting - casa-trabalho-casa) anual em transporte individual motorizado entre seus funcionários, em vinte porcento (maioria, em automóvel próprio). O cumprimento da lei é sempre sistematicamente auditado e relatado nos detalhes aos níveis superiores de gestão da administração. Resultado: sucesso do Programa daquele estado em todos os sentidos .... e o percentual de redução dos deslocamentos corporativos, de fato, acabou sendo maior que vinte porcento, segundo informações pessoais de gestores e especialistas locais - o que, grosso modo, corresponde, no mínimo, a vinte porcento a menos em emissões de poluentes tóxicos locais e de gases que provocam o aquecimento do planeta.

Os governos de outros estados americanos e todas as empresas governamentais federais praticam regras similares à Carolina do Sul, desde o início da década dos anos noventa naquele país, proporcionando um benefício ambiental nacional e planetário de grandeza descomunal.

Um exemplo mais recente que surpreendeu, em 2017, foi o da Administração da Área Metropolitana do Vale de Aburrá (onde está Medellin) na Colombia. Sensíveis à recomendação de representante da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades (Sobratt), presente durante as últimas rodadas de discussão para definição do plano estatégico de controle da grave poluição do ar que paira sobre Medellin, os coordenadores do plano de despoluição local anunciaram recentemente o compromisso oficial de, nada menos, que quinhentas empresas da região, com a adoção do Teletrabalho.

Em termos de controle de poluição do ar, não há nenhum outro programa ou medida que possa trazer um benefício ambiental dessa ordem (supressão total da emissão de poluentes em cada deslocamento não realizado) - e numa única tacada tão simples, lucrativa e vantajosa para todos. Só a eficaz - mas politicamente complexa - inspeção obrigatória dos veículos a diesel e os caros programas de substituição de frota, chegam próximo desse feito.

Além da mudança do paradigma cultural no ambiente laboral, que por si só, representa resistência à ideia do Teletrabalho, esse tema é ainda muito pouco explorado no Brasil pela distraída comunidade ambientalista e pelos desatentos magos e cientistas da administração. Uma pena: isso acaba gerando desinteresse coletivo no Teletrabalho e ausência de compreensão de seus virtuosíssimos fundamentos ambientais, especialmente no que diz respeito ao potencial de eliminação da poluição do ar local, combate ao aquecimento do clima e melhoria da qualidade de vida - algo como uma rara pérola mágica de ganha-ganha-ganha-ganha ..... e mais, o Teletrabalho não tem nenhuma desvantagem ou dificuldade, para quem quer que seja, e é imediatamente reversível, em caso de implementação descuidada.

Para se ter uma ideia, na prática, em importantes agências ambientais brasileiras, até há muito pouco tempo, mesmo entre ícones do meio ambiente e especialistas mais experientes, falar em Teletrabalho e Gestão de Mobilidade Corporativa - GDM como estratégia de controle de poluição e melhoria da mobilidade urbana, parecia à primeira vista algo bizarro ou algum tipo de brincadeira de salão. Atualmente, as coisas já estão mudando, para nossa sorte.

Não obstante, o teletrabalho funciona melhor se mesclado com trabalho presencial - veja: 

http://www.bbc.com/capital/story/20180130-what-if-you-never-saw-your-colleagues-in-person-again?ocid

Olimpio Alvares é engenheiro mecânico pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo em 1981, Diretor da L'Avis Eco-Service, especialista em transporte sustentável, inspeção técnica, emissões veiculares e poluição do ar; concebeu o Projeto do Transporte Sustentável do Estado de São Paulo, o Programa de Inspeção Veicular e o Programa Nacional de Controle de Ruído de Veículos; é fundador e Secretário Executivo da Comissão de Meio Ambiente da Associação Nacional de Transportes Públicos - ANTP; Diretor de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades - SOBRATT; é assistente técnico do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental - PROAM; consultor do Banco Mundial, do Banco de Desenvolvimento da América Latina - CAF e do Sindicato dos Transportadores de Passageiros do Estado de São Paulo - SPUrbanuss; é membro titular do Comitê de Mudança do Clima da Prefeitura de São Paulo e coordenador de sua Comissão de Transportes e Energias Renováveis; membro do grupo de trabalho interinstitucional de qualidade do ar da Quarta Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural (4CCR) do Ministério Público Federal; colaborador do Conselho Nacional do Meio Ambiente - Conama, Instituto Saúde e Sustentabilidade, Instituto Mobilize, Clean Air Institute, World Resources Institute - WRI-Cidades, Climate and Clean Air Coalition - CCAC e do International Council on Clean Transportation - ICCT; é ex-gerente da área de controle de emissões veiculares da Cetesb, onde atuou por 26 anos; participa da coordenação da Semana da Virada da Mobilidade.