30/04/2017 20:40 - Marcos Timóteo Rodrigues de Sousa
INTRODUÇÃO
Em diferentes momentos históricos e em diferentes espaços urbanos, os transportes e as formas de circulação de pessoas nas cidades são, muitas vezes, determinados pela concentração da população em determinado espaço; de certa forma, isso gera variados padrões de mobilidade urbana. Para um melhor entendimento da mobilidade no espaço urbano, pode-se ater a várias metodologias de análise; os estudos da população, por meio do entendimento da transição demográfica, pode ser um dos melhores caminhos de explicação da realidade. A transição demográfica e a transição urbana tiveram fases distintas, sendo que cada uma delas teve impactos específicos sobre os padrões de mobilidade urbana. A primeira transição urbana foi o momento em que a população urbana supera a população rural. A segunda transição urbana é uma fase em que as tendências de crescimento populacional urbano perdem sua força e a redistribuição desta população no tecido urbano tornam-se transformações mais relevantes. Entende-se que estas duas fases se dão na Europa e Estados Unidos no final do século XIX e pós 1940, respectivamente. As fases de transição demográfica e urbana no Brasil e em países periféricos ocorreram tardiamente e de forma mais acelerada. Entende-se que a análise demográfica é um dos melhores aportes teóricos para compreender a dinâmica e os desdobramentos da estrutura do espaço intraurbano.
DEMOGRAFIA E TRANSPORTE URBANO
A forma e o desenho urbano só têm função perante o uso das pessoas no espaço urbano,
ou seja, teorizar acerca da formação de uma barreira e da estruturação física de uma
cidade recai sobre as formas de morar e circular. Os estudos de demografia urbana têm
por objetivo também entender as variadas formas de aglomeração humana em diferentes
tipos de cidades e em diferentes épocas.
Segundo Tabautin (2000) em seu estudo sobre demografia urbana, os primeiros estudos
sobre as cidades procuravam refletir a ascensão de uma classe social, entendendo o
individualismo da burguesia. O autor entende que o meio urbano, por meio dos estudos
dos regimes demográficos, passa pelos estágios primitivo, intermediário e
contemporâneo. Os dois primeiros estágios eram as etapas de crescimento econômico; o
terceiro estágio era a fase de estabilização das classes sociais. Partindo desta mesma
premissa, nos anos de 1970 a modernização era um processo que tendia a homogeneizar
toda a sociedade, ou seja, se ajustando aos moldes ocidentais norte-americanos. Tabautin
(2000) diz que entre os anos de 1960 e 1970 o caminho para a modernização era a
urbanização, e com isso as taxas de natalidade, fecundidade e mortalidade cairiam, ao passo que os
níveis educacionais, de emprego e saúde, subiriam. O demógrafo diz que a urbanização pode
gerar problemas relacionados às migrações pendulares, ou seja, a procura por emprego e
educação nos centros urbanos.
Monte-Mor (2006a) fala sobre a teoria da transição demográfica, chamando a atenção
para a ideia de transição urbana. O autor afirma que as principais mudanças se dão na
organização da família e na estruturação dos lares, ou seja, há um adiamento dos
casamentos e da paternidade, multiplicação nos domicílios unipessoais e uniparentais, o
prolongamento da permanência na casa paterna, formas de convivência marital informal e
o aumento de divórcios. Todas estas transformações, no Brasil, fazem parte da chamada
segunda transição demográfica (estágio contemporâneo), proporcionando uma queda da
fecundidade, prolongamento de áreas periféricas de alta e baixa renda e maiores
necessidades de viagens dentro do espaço intra e inter-urbano.
Segundo Carmo (2014) a taxa bruta de mortalidade no Brasil no ano de 1900 era da
ordem de 27,8 óbitos por mil habitantes; em 2000, há uma queda para 6,5 mortes por mil.
No mesmo período a taxa bruta de natalidade passou de 46 nascimentos por mil para 21,5
por mil. O principal elemento deste processo são as mudanças na taxa de fecundidade,
pois em 1903 a taxa era de 7,7 filhos por mulher, em 1970 foi de 5,8 filhos, em 1991
chega em 2,5 e em 2003 alcança 2,1 filhos por mulher. Vale ressaltar também a
queda na taxa de mortalidade infantil, a qual registrava 45,3 óbitos por mil em 1990, ao passo que no
ano de 2011 registrou 15,3 mortes por mil nascidos.
Em relação ao espaço urbano e a estrutura das cidades brasileiras podemos nos basear em
Carmo (2014), o qual diz que a queda da fecundidade ocorreu primeiramente e de
maneira mais intensa nas regiões onde os indicadores de nível de escolaridade das
mulheres eram maiores. Outro fato importante para o arranjo das cidades é de que o
envelhecimento relativo da população, principalmente considerando-se as taxas
significativas de crescimento da população idosa, exigirá adaptações em termos de
políticas sociais, especialmente nas áreas de saúde e de previdência social. As políticas
públicas aliadas às localidades das cidades que possuem maiores quantidades de idosos
terão arranjos espaciais diferenciados, proporcionando diferentes formas de mobilidade
urbana.
Brito (2008) chama a atenção para o “bônus demográfico”, no qual consiste num
crescimento da população com faixa etária entre 15 a 59 anos, potencializando o consumo
e a geração de renda por meio do trabalho e compras. Em se tratando de arranjo territorial
podemos vislumbrar a materialização nas cidades dos centros comerciais e bairros de
classe média. A transição demográfica é um processo que pode ser potencializado em
todas as regiões do Brasil, mas, em tempo e espaço diferenciados, gerando diversidades
em níveis local e regional, proporcionando uma nova paisagem na formação populacional
brasileira.
Segundo Paviani (1989) alguns autores ainda se equivocam ao ligar fortemente o conceito de urbanização a uma de suas facetas ou a um de seus componentes, que é o demográfico. Ele afirma a ideia de que o componente populacional da urbanização é importante, mas não é um elemento fundamental para uma análise urbana. Paviani (1989) diz que a urbanização é processual e multivariada, cujos componentes se desdobram em:
- surgimento e desenvolvimento de uma dada rede urbana, fruto da interligação do sistema produtivo, da distribuição e do consumo;
- crescimento físico-estrutural das cidades, com diversos graus de dinamismo ou desenvolvimento do processo;
- transformações ou mudanças sociais e econômicas (espaciais e não espaciais),
impulsionadas por modernizações tecnológicas e científicas nos setores da produção
industrial, serviços e intercâmbio comercial.
Pela visão processual da urbanização, fica evidente que a população está permeando cada um destes componentes, pois é ela que impulsiona o processo, com graus variados de impactos sobre as cidades, dependendo do contexto geográfico e das formas que assume o próprio processo de produção e de consumo. A questão populacional, colocada nestes termos, implica em reconhecer, por exemplo, que o crescimento demográfico, ao lado de fazer crescer fisicamente o meio urbano (pela expansão das periferias), é fator de mudanças econômicas e sociais e mesmo de transformações capazes de encontrar saídas para os problemas emergentes.
Segundo Carmo (2014) a população brasileira chegará num volume máximo de 228,4
milhões de habitantes. Esta afirmação está apoiada nos estudos do PNAD e pelo CENSO
do IBGE. Nesta perspectiva podemos afirmar que a população brasileira ficará cada vez
mais urbana. Em 2010 as áreas urbanas tinham uma população de 160,9 milhões de
habitantes, correspondendo a 84% da população do país; as projeções para o ano de 2040 é
de que a população urbana terá 205 milhões de habitantes, equivalendo a 90% da
população nacional, ou seja, um acúmulo de cerca de 30 a 45 milhões de pessoas no meio
urbano brasileiro (IBGE, 2013).
Marcos Timóteo Rodrigues de Sousa - Professor do curso de Engenharia Civil - UNG (Universidade de Guarulhos)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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MONTE-MOR, R.L.M. A cidade e o urbano. In C.A.L. Brandão (ed.), As cidades da cidade (p.185-197). Belo Horizonte: UFMG, 2006a.
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