02/09/2015 07:10 - Valor Econômico
Para atrair mais empreiteiras pequenas e médias, o governo
resolveu fazer novas mudanças nos próximos leilões de rodovias federais. A
partir de agora, não haverá mais nenhuma exigência de patrimônio líquido mínimo
para quem quiser entrar nas disputas.
O objetivo é remover entraves para a participação de grupos
menores nos leilões, bem como de empresas estrangeiras, conforme explicou ao
Valor a secretária-executiva do Ministério dos Transportes, Natália Marcassa.
Na última rodada de concessões de estradas, a Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) definiu um valor mínimo de patrimônio
líquido para habilitar empresas interessadas nos leilões. Esse montante ficava
entre R$ 400 milhões e R$ 870 milhões, dependendo dos investimentos no trecho
oferecido à iniciativa privada. A mesma exigência estava na minuta de edital da
Rodovia do Frango, um corredor logístico de 460 quilômetros no Paraná e em
Santa Catarina, que foi discutida com investidores em audiência pública e
estabelecia um valor de R$ 430 milhões.
Na nova versão do edital, que foi enviada ao Tribunal de
Contas da União (TCU) na segunda-feira, o governo abriu mão da cláusula de
patrimônio líquido. A decisão valerá para os 14 outros lotes de rodovias que o
governo quer leiloar até o fim de 2016. De acordo com Natália, essa mudança não
foi motivada pela Operação Lava-Jato, mas reflete um estímulo à maior concorrência
nos leilões.
À exceção da BR-050, assumida por um "pool" de dez
construtoras de pequeno ou médio porte, todas as concessões de rodovias feitas
entre 2013 e 2014 foram arrematadas pelos grandes grupos nacionais - boa parte
controlados por empresas envolvidas na Lava-Jato. O patrimônio líquido era
visto como uma barreira à diversificação dos concorrentes. Empreiteiras menores
teriam dificuldades em atingir os valores mínimos exigidos pelo governo.
Enquanto isso, as estrangeiras costumam ter um nível de endividamento mais alto
e patrimônio menor nos balanços.
"Com essa tacada, o governo toma uma boa
iniciativa", diz o presidente da comissão de obras públicas da Câmara
Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Carlos Eduardo Lima Jorge. Ele
considera que, para o sucesso da segunda etapa do programa de concessões, não
se pode manter a dependência das gigantes do setor. "Há claramente uma
necessidade de abrir espaço para os grupos médios", enfatiza Lima Jorge.
O executivo afirma que já esperava uma redução da exigência
de patrimônio líquido, mas não o fim da cláusula. "Isso ajuda as empresas
menores daqui e facilita a entrada de companhias de fora", acrescenta.
Segundo ele, é nítido o interesse das construtoras pequenas e médias nos
leilões de rodovias, inclusive como forma de gerar novas fontes de receitas.
"Quem depende de recursos do OGU [Orçamento Geral da União] ficou a ver
navios."
Lima Jorge expõe, no entanto, uma preocupação: não
escancarar as portas para construtoras estrangeiras e prescindir das empresas
nacionais. "O ideal seria fomentar condições para trabalhemos em
parceria", pondera.
Para o especialista em infraestrutura Luís Felipe Valerim
Pinheiro, sócio do VPBG Advogados, a retirada da exigência de patrimônio
líquido deve mesmo aumentar a concorrência e diminuir a barreira de entrada
para estrangeiros nos leilões. Sem outros mecanismos que garantam a presença de
empresas saudáveis nos certames, porém, corre-se o risco de deixar as futuras
concessões nas mãos de "aventureiros".
"O importante é não fragilizar a execução do contrato.
É preciso tomar outras precauções", diz Valerim, que era coordenador da
área de infraestrutura e energia na Casa Civil durante o primeiro mandato de
Dilma Rousseff. Ele integrava a equipe que discutia a elaboração de boa parte
dos editais dos leilões de 2013 e 2014.
A secretária-executiva afirma que o governo está tomando uma
série de cuidados para evitar riscos de não execução contratual. Segue válida,
por exemplo, a obrigatoriedade de apresentação de garantias financeiras que
endossem as propostas feitas nos leilões. Isso pode ser feito por meio de
seguro ou de fiança bancária.
Também continua intocada a necessidade de aporte
significativo para capitalizar as sociedades de propósito específico (SPEs) que
assumem as concessões. No caso da Rodovia do Frango, a integralização de
capital exigida é de R$ 200 milhões - R$ 138 milhões na assinatura do contrato
e o restante até um ano após a concessão.
Para leiloar esse lote, o governo ainda depende de aval do
TCU. A tarifa máxima de pedágio foi fixada em R$ 14,62 por cada 100 quilômetros
e aposta-se na concorrência para diminuí-la.