23/10/2015 08:02 - Folha de SP
PAULO ALEXANDRE BARBOSA / NELSON GONÇALVES DE LIMA JÚNIOR
Chegou em ótimo momento o resultado da primeira fase da mais
recente pesquisa internacional sobre mudanças climáticas e elevação do nível do
mar. Apenas três localidades tiveram o privilégio de servir de modelo para a
projeção personalizada sobre os cenários climáticos futuros: Broward (EUA),
Selsey (Reino Unido) e Santos, a única cidade de toda a América Latina.
O Projeto Metropole reúne os mais renomados cientistas
locais e estrangeiros na busca de soluções para a adaptação humana ao aumento
do nível do mar, tempestades e ressacas.
Após dois anos de pesquisas em Santos, cientistas chegaram a
conclusões inúmeras, entre elas a de que haverá elevação mínima de 18 cm no
nível do mar até 2050 (daqui a 35 anos) e que isso pode chegar a um metro em
2100, se for considerada projeção do painel de mudanças climáticas da ONU.
Um desavisado que more em cidade ao nível do mar, como
milhões de brasileiros, a esta altura do texto já preparou suas malas e fugiu
para as montanhas. Nós, santistas, não.
É fato amplamente divulgado pelos cientistas do Metropole,
inclusive nesta Folha, que Santos não terá pontos de alagamento permanentes.
Mas terá, sim, de se planejar para maré mais alta, tempestades e ressacas.
A escolha de Santos como base de estudos não se deve ao
acaso. O município possui registros de maré desde 1945 e foi objeto de inúmeras
pesquisas. O projeto, financiado pela Fapesp, teve apoio de engenheiros da
prefeitura e contou com informações das secretarias de Finanças,
Desenvolvimento Urbano, Meio Ambiente e Defesa Civil.
Antes mesmo de apoiar o estudo científico, a cidade havia
concluído um sistema de georrefenciamento de última geração, a laser. Também já
havia iniciado obras e projetos de macrodrenagem para se antecipar às mudanças.
O município tem duas regiões sensíveis ao nível do mar. A primeira
é a orla, onde já se identifica processo de erosão na Ponta da Praia. Isso pode
estar sendo causado tanto pelo aumento da calha do porto para passagem de
navios de maior porte quanto pela alteração do mar. O fato é que Santos está
perdendo duas praias e precisa avançar em busca de uma solução.
A segunda região sensível é a Zona Noroeste, fundada sobre
uma ampla área de manguezal. Lá, o lençol freático está a meio metro de
profundidade e ocorre enchente seca, sem chuva, quando o nível do mar está alto
ou a ressaca é muito intensa.
O fenômeno, de ordem mundial, exigirá empenho em milhares de
cidades para a população se adaptar às mudanças climáticas. E é exatamente por
isso que Santos é uma cidade privilegiada.
Ao ser estudada por esse seleto grupo de cientistas e saber
antecipadamente o que pode mudar no ambiente nos próximos 85 anos, a cidade sai
na dianteira em planejamento de ações que resultem em melhor qualidade de vida
aos cidadãos. São dados que pouquíssimos municípios possuem.
Com esse intuito está sendo criada uma comissão permanente
para sugerir as intervenções necessárias na cidade, como construção de
quebra-mar, engordamento das faixas de areia nas praias, melhoria do sistema de
drenagem e expansão e aprimoramento de diques. O grupo será multissetorial e
envolverá representantes dos mais diversos segmentos da sociedade.
Estamos falando de como a cidade, que abriga o maior porto
da América Latina e é referência em turismo e qualidade de vida, se adaptará às
mudanças climáticas. O grupo multissetorial tem o ponto de partida e o de
chegada: que cidade deixaremos para nossos descendentes? Mais uma vez Santos se
antecipa. Mais uma vez a cidade se apodera da história futura.
Paulo Alexandre Barbosa,
36, é prefeito de Santos (PSDB)
Nelson Gonçalves de Lima Júnior, 54, é secretário de Desenvolvimento Urbano de Santos