20/10/2014 06:30 - O Globo
ALUÍZIO DOS SANTOS JÚNIOR eALFREDO RENAULT
Há quatro décadas, o Brasil foi sacudido por uma crise
econômica gravíssima. Com o "milagre econômico" já em seus estertores, o
"país do futuro" se viu nas cordas por conta do choque do petróleo. Os
grandes países produtores do Oriente Médio, e mais a Venezuela, organizaram-se
para obter fatias maiores sobre o óleo que retiravam, enfrentando as chamadas
Sete Irmãs. Nosso país, então com um modelo econômico baseado na importação de
petróleo e de bens de capital, via também os investimentos externos se reduzirem
e os produtos brasileiros enfrentarem barreiras alfandegárias em países
igualmente afetados pelo choque do petróleo.
O resultado foi aquele que nós, infelizmente, vivenciamos
mais de uma vez em passado recente: recessão, arrocho salarial, retrocesso no
resgate da imensa dívida social acumulada desde sempre. Não por coincidência, a
exploração do óleo em águas profundas tem aí sua gênese. O esforço de
engenheiros e cientistas brasileiros levou à descoberta que nos daria o
combustível do desenvolvimento.
Agora, vivemos às portas de um novo ciclo de igual magnitude
— ou até maior. As grandes reservas descobertas no pré-sal vão proporcionar um
volume de excedentes que pode contribuir decisivamente para acelerar o processo
de avanço social do país com a riqueza gerada por sua produção e exportação. As
estimativas apontam para mais de 30 bilhões de barris. Embora o horizonte de
produção seja de décadas, significam renda bruta de US$ 3 trilhões a preços
atuais.
A ampliação da oferta e a universalização do acesso à
energia têm sido um desafio permanente para o desenvolvimento econômico e
social, e que muda de dimensão pela inclusão, irreversível, de valores
ambientais e de sustentabilidade. Já a produção de excedentes de fontes
primárias de energia é uma oportunidade de geração de riqueza por seu valor no
comércio internacional e pelo processo em si, promotor do avanço industrial por
conta dos vultosos investimentos que mobiliza.
O Brasil, pelas dimensões e características de suas bacias
hidrográficas e pela produção do etanol, apresenta matriz energética
diversificada e com parcela considerável de energia renovável, cerca de 45%.
Por motivos diferentes, essas são as duas principais fontes energéticas que ora
apresentam problemas de oferta. A contribuição da energia renovável na matriz
nacional é mais relevante quando comparada aos menos de 15% de participação
renovável na matriz mundial.
Essa posição privilegiada não significa que sejamos menos
impactados pelos novos desafios para a produção de energia. O avanço das
energias renováveis no mundo — em especial eólica e solar —, na substituição de
derivados de petróleo e carvão para a geração de energia elétrica, mostra que o
processo em curso se acelera e que estamos atrasados, ainda mais se
considerarmos que o clima amplia nosso potencial de geração. Mas é inegável o
domínio que o petróleo ainda terá nas próximas décadas como fonte energética
primária, principalmente pela dificuldade de substituí- lo, em dimensões
globais, no setor de transporte, sem contar sua importância como gerador de
matéria-prima para a indústria petroquímica e toda a sua cadeia de
transformação.
Não há contradição, e sim sinergia, entre gerar a grande
riqueza do pré-sal e acelerar nossa caminhada na direção das novas energias
renováveis. Além do investimento na área social e da geração de emprego e renda
da própria produção do pré-sal, parcela dos recursos gerados deve ser a força
propulsora para a ampliação dos projetos de energia solar e eólica, entre
outras.
Assim, defender o pré-sal é muito mais do que uma bandeira
partidária ou ideológica. É um posicionamento que marca a fixação do Brasil
como um gigante no cenário mundial, permitindo manter o país na rota do
desenvolvimento e das conquistas sociais que têm nos pautado. O pré-sal deve
ser uma política de Estado, não pode variar ao sabor das mudanças nos governos,
em quaisquer das esferas — federal, estadual ou municipal.
Portanto, é preciso que saibamos usar essa riqueza com inteligência, incentivando a inovação, a pesquisa científica e o uso crescente de fontes limpas e renováveis de energia. O legado do pré-sal pode e deve ser a mudança da matriz energética de nosso país.
Aluízio dos Santos Júnioré prefeito de Macaé, e Alfredo Renaulté professor da PUC-RJ