Uso político de tarifas

25/05/2013 06:17 - O Estado de SP

EDITORIAL

O anúncio da nova tarifa dos três meios de transporte coletivo da capital paulista – ônibus, metrô e trem –, que vai vigorar a partir do dia 2 de junho, deixou bem claro o caráter predominantemente político desse aumento. Ela passa de R$ 3,00 para R$ 3,20, um reajuste de 6,7%, muito abaixo da inflação no caso do ônibus, serviço gerido pela Prefeitura, cujo índice acumulado desde o último aumento foi de 14,4%.

No caso do metrô e do trem, estes de responsabilidade do Estado, a diferença foi menor (inflação de 7,2%). Os paulistanos terão a ilusão de que estão sendo favorecidos, mas acabarão por perceber que não existe nada de graça e eles é que, de uma forma ou outra, pagarão a conta desse artifício.

Por interferência direta do governo federal – que com isso tenta conter a escalada da inflação e favorecer a reeleição da presidente Dilma Rousseff –, o prefeito Fernando Haddad concordou com um aumento irreal, que deveria ficar entre R$ 3,20 e R$ 3,30.

Constrangido, o governador Geraldo Alckmin teve de aceitar também a proposta. Se não o fizesse, pagaria um preço político alto, pois certamente seria apontado como o responsável pela adoção impopular de uma tarifa maior.

Para forçar a opção pelo valor mais baixo, de R$ 3,20, o governo federal prometeu editar Medida Provisória suspendendo a cobrança de dois impostos – PIS e Cofins – sobre a tarifa de ônibus, metrô, trens e barcos. Como isso não pode ser feito apenas para esta ou aquela cidade isoladamente, ela atinge todo o País. Essa renúncia fiscal, portanto, é parte do preço a pagar para evitar que o aumento realista das tarifas de transporte coletivo nas capitais, a começar por São Paulo, que tem um peso grande no índice inflacionário, prejudique projetos eleitorais. O alvo não é domar a inflação – com o que toda pessoa sensata estaria de acordo –, mas abrir caminho para as ambições políticas da presidente e seu partido.

Essa intenção já tinha ficado evidente, quando o governo federal interveio com êxito junto a Haddad e Alckmin, meses atrás, para conseguir deles o adiamento do reajuste daquela tarifa, normalmente feito em janeiro ou fevereiro, para junho. Não contente, agora ele resolveu jogar mais pesado e novamente obteve o que queria. O prejuízo, que tinha sido grande com o dinheiro que deixou de entrar por causa do adiamento, ficou ainda maior com o aumento abaixo da inflação.

Os cálculos feitos pela própria Prefeitura, como mostra reportagem do Estado, indicam que a conta vai ser salgada. Os subsídios ao serviço de ônibus devem chegar a R$ 1,25 bilhão este ano, valor que é o dobro do previsto no orçamento. Maior também do que o que foi pago no ano passado – R$ 960 milhões. Esse dinheiro vem dos impostos, ou seja, os bilionários subsídios aos ônibus serão pagos por todos os paulistanos, não apenas pelos que usam esse meio de transporte. Com a agravante de que o serviço prestado pelas empresas concessionárias é, notoriamente, de péssima qualidade.

Outro aspecto negativo do aumento considerável dos subsídios, provocado pelo reajuste irreal da tarifa, é que, como esse dinheiro não cai do céu, ele terá de ser tirado de outros setores da administração. A capacidade de investimento da Prefeitura, que já está muito abaixo das necessidades, como não se cansa de reclamar o atual governo, sofrerá novo baque, de algumas centenas de milhões de reais. Embora os dois tenham sido envolvidos na manobra eleitoral da presidente, a ênfase vai para o prejuízo da Prefeitura, porque ele é maior que o do Estado.

O uso político de tarifas de serviços públicos sempre dá errado. O ex-prefeito Gilberto Kassab também congelou a tarifa de ônibus por mais de dois anos, com objetivos eleitorais, com as mesmas conseqüências de agora, e sofrendo de seus adversários – nesse caso com toda razão – as mesmas críticas.

Essa lição, apesar de tão recente, não foi aprendida. Haddad, pressionado pela presidente Dilma, e Alckmin, constrangido pelos dois, estão repetindo o erro, pelo qual, é claro, os paulistanos vão pagar.