05/04/2015 07:55 - Correio Braziliense
Ofertar faixas, passagens subterrâneas e passarelas é um dos
meios de manter o pedestre seguro. Mas é preciso pensar além disso. Doutora em
mobilidade não motorizada pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de São Paulo, Meli Malatesta diz que, só para começar, tomadores
de decisão e planejadores dos espaços públicos de circulação se referem,
erroneamente, à mobilidade a pé como pedestres. Para a especialista, essa é uma
forma equivocada de denominação e traz como consequência a perda da visão da
mobilidade a pé como sistema, levando a um enfoque empobrecido, por ser pontual
e direcionado ora no pedestre, ora na faixa de travessia; ora na calçada, ora
na passarela.
Após a revisão do conceito, Meli lembra que o segundo passo
é a sociedade tomar ciência de que 40% das viagens diárias no Brasil são
executadas totalmente a pé, sendo o modo mais praticado nas cidades
brasileiras. Por isso, segundo ela, é preciso rever as formas de utilização dos
espaços públicos de circulação, mudar leis, melhorar calçadas, tempos de
travessias e fazer campanhas educativas. Mesmo em relação ao transporte
público, os passageiros não afloram no interior dos ônibus ou metrôs. Eles
chegam aos pontos, às estações e aos terminais caminhando e, dessa forma, saem
deles. Assim, seus espaços públicos também deverão estar adequados para
priorizar a mobilidade a pé, defende Meli, que integra a Comissão Técnica
de Mobilidade da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP).
Na avaliação do sociólogo Eduardo Biavati, nos últimos anos,
a discussão sobre a faixa de pedestres acabou engolida pelo debate da
mobilidade urbana. Isso, segundo ele, não chega a ser ruim, uma vez que o
debate é mais amplo e engloba temas como o planejamento do espaço urbana, a
faixa, a calçada, a ciclovia, a faixa exclusiva para ônibus e o deslocamento
dos carros. A coisa ficou mais complexa. Não tem como pensar em uma cidade mais
justa sem pensar no pedestre. E a segurança dele não se resolve só com calçada
e faixa. É preciso desmontar a lógica da cidade pensada só para o carro,
defende.
O grande desafio dos gestores, segundo Biavati, será com a
população idosa. Temos uma proporção cada vez maior de idosos que continuam
pedestres ou que voltam a ser pedestres. Mesmo em Brasília, é fácil ver idosos
com dificuldade de andar. Os gestores terão ainda outra missão: a de educar
essa parcela crescente da população brasileira sem fazê-la se sentir incapaz.
Com o envelhecimento, há dificuldade de julgamento de distância e velocidade do
veículo. As habilidades vão ficando limitadas, e o corpo não responde como
antes.
Houve avanços nesses últimos 18 anos, mas ainda há muito o que avançar. Para as mortes no trânsito deixarem de ser uma epidemia, o Estado precisa assumir o problema e definir políticas perenes de educação, fiscalização e punição aos infratores, além de melhorar a engenharia. À sociedade cabe se mobilizar e cobrar ações efetivas por parte do governo, além de cumprir as leis de trânsito. Cada um fazendo a sua parte, menos pais chorarão as mortes precoces dos filhos. E menos filhos ficarão órfãos.