23/04/2014 08:30 - O Globo
Leia: Montadoras
e sindicatos querem usar o seguro-desemprego para pagar salários - O Estado de
SP
Alemanha
salva 400 mil empregos durante a crise - O Estado de SP
ELIO GASPARI
A repórter Cleide Silva revelou que a Casa Civil da
Presidência da República, as montadoras e os sindicatos estão discutindo um
socorro para os trabalhadores ameaçados com a perda do emprego por causa da
queda nas vendas de veículos. No ano passado elas caíram 0,9%, e, no último trimestre,
mais 2,1% em relação ao mesmo período de 2013. Cerca de 1.500 operários já
perderam seus empregos.
As empresas e os sindicatos discutem a importação de um
mecanismo eficaz, usado na Alemanha. Nele, o trabalhador reduz sua carga
horária, mantém seus benefícios e, durante um período de seis meses a dois
anos, recebe até 67% do que lhe é devido. No limite, recebe mesmo sem
trabalhar. Um pedaço dessa conta vai para a Viúva. Aí está o primeiro problema.
O segundo está no exemplo. O mecanismo alemão foi acionado
pela primeira vez no século passado, quando a banda federal engoliu a
comunista. Depois, em 2009, diante da crise financeira mundial, quando a venda
de veículos caiu 30% e o PIB do país sofreu uma contração de 4%. Nada a ver com
o que sucede no Brasil, onde a taxa desemprego é baixa, mas o ministro Guido
Mantega repete a marchinha: "Este ano não vai ser igual àquele que passou.”
Ninguém quer ver trabalhadores desempregados e as
montadoras, com razão, preferem preservar sua mão de obra qualificada. Contudo,
do jeito que as empresas e os sindicatos formularam-na, a proposta assemelha-se
mais a uma empulhação do que a um programa social. Mais um caso em que a
sacrossanta "destruição criadora” do capitalismo é reciclada no Brasil
destruindo a Bolsa da Viúva para criar puxadinhos de cartórios. A redução dos
impostos cobrados às montadoras permitiu que vendessem 3,8 milhões de veículos
em 2012. Seus operários mantiveram os empregos, mas não viram a cor desses
lucros. Essa mesma desoneração resultou em menos arrecadação e, portanto, em
menos dinheiro de volta para quem paga impostos. (Admitindo-se que o dinheiro
pago volta, o que é uma licença poética.)
Se os empresários e sindicalistas estão diante de uma crise,
devem botar a boca no mundo, expondo as razões pelas quais as vendas de
veículos caíram. É verdade que isso não faria bem à campanha eleitoral da
doutora Dilma e de seu comissariado. Coisas da vida. O que não se pode é viver
num país sem problemas, importando-se um mecanismo de amparo social usado na
Alemanha quando ela estava engolindo uma nação sucateada ou quando o mundo
estava se acabando.
Resta também discutir o tamanho da conta. É uma Bolsa
Metalúrgico ou uma Bolsa Montadora? Num aspecto, o problema deriva da rigidez
das leis trabalhistas nacionais. Lula entrou na política dizendo que a
Consolidação das Leis do Trabalho era "o Ato Institucional nº 5 dos
trabalhadores”. O PT está no Planalto há 11 anos, refestelado no conforto que
essa legislação dá a quem tem a chave do cofre do Ministério do Trabalho.
O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de
Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Moan, diz que "esse é o momento para
retomarmos a discussão sobre um plano de estabilização dos empregos, mas
pensamos no longo prazo, e não apenas na situação atual”. Ótimo, para todos os
setores da economia e para todos os trabalhadores.