O comércio mundial e o setor de turismo devem crescer a
taxas elevadas nas próximas décadas. Mas, para o setor de transportes, isso não
é apenas motivo de comemoração. O aumento no fluxo de navios, aviões e trens
carregando mercadorias e turistas ao redor do globo traz também uma grande
preocupação: o que acontecerá com as emissões de CO2?
Para participantes da cúpula do Fórum Internacional de
Transportes (ITF), órgão intergovernamental que reúne 54 países, essa é uma
preocupação maior até mesmo do que um possível nó logístico que esse novo
cenário pode acarretar.
"O número de turistas viajando pelo mundo no ano
passado chegou a 1,1 bilhão", disse ontem José Ángel Gurría,
secretário-geral da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico), na abertura do evento, em Leipzig. "Daqui a 35 anos, serão 3,5
bilhões. E o fluxo de comércio vai quadruplicar."
Para Gurría, haverá graves problemas tanto para o comércio
quanto para o turismo se países e empresas não levarem em conta o aquecimento
global. "E se as emissões relacionadas ao comércio global e ao turismo
crescerem nessa mesma proporção?", questionou. "Isso não é
sustentável, não é viável economicamente nem aceitável politicamente."
Participantes da cúpula em Leipzig são unânimes em apontar
que os países emergentes crescerão a taxas maiores do que as economias
desenvolvidas nas próximas décadas. E, com isso, as emissões geradas nesses
países - onde há menos recursos e tecnologia, além de um apetite maior por
energia - viram motivo de preocupação.
Alguns indícios já começam a aparecer. Segundo dados da
OCDE, desde a década de 1990 as emissões dos 34 países-membros da entidade já
não acompanham o crescimento de suas economias. No período entre 2008 e 2012, o
crescimento foi negativo. Já entre os países não membros, teoricamente mais
pobres, a tendência é de alta mais elevada tanto do PIB quanto das emissões.
Em um dos painéis de ontem, Alexander Körner, analista da
Divisão de Políticas de Tecnologia Energética da Agência Internacional de
Energia (AIE), disse que o aumento da renda nos emergentes, com consequente
alta no consumo, também eleva o potencial poluidor desses países, "onde
serão vendidos mais carros do que nas economias desenvolvidas no futuro".
Além disso, faltam políticas de eficiência energética na
maior parte das economias emergentes, afirmou, citando especificamente a
América do Sul. Para ilustrar, mostrou um dado sobre o consumo médio dos
automóveis entre os países-membros da OCDE e os não membros na última década.
Em 2005, disse, um carro consumia em média 8,6 litros de
gasolina a cada 100 km nos países do primeiro grupo e 7,3 litros nos do
segundo. Em 2013, os automóveis nos países da OCDE haviam reduzido seu consumo
médio para 6,9 litros, menos do que os 7,2 litros daqueles nos demais países.
Patrick Oliva, vice-presidente-sênior da Michelin, disse não
estar "absolutamente convencido de que o comércio se quadruplicará e o
fluxo de turistas triplicará" no prazo calculado por Gurría, da OCDE.
Segundo ele, "se isso acontecer, nós teremos um problema real".
Para ele, no entanto, se esses números dobrarem, "será
absolutamente factível reduzir as emissões pela metade". "Graças ao
aprimoramento tecnológico, haverá carros elétricos e outros que consomem dois
litros de gasolina a cada cem quilômetros", afirmou. "Eu acho que os
próximos 35 anos nos darão várias oportunidades de ver como nós precisamos
formular as políticas públicas e como os negócios devem se organizar."
Para Alain Flausch, secretário-geral da Associação
Internacional de Transporte Público, a eficiência no setor passa também por
"reduzir a mobilidade inútil". "Muitas pessoas nas cidades usam
seus carros para viagens de menos de dois quilômetros. Massificar o transporte
é uma das coisas que podem manter o mundo vivo nos próximos anos", afirmou.
O comércio global também tem seus exemplos de
"mobilidade inútil", disse ele. "Você transportar flores por via
aérea a uma distância de 5.000 km não faz sentido", disse ele. "Nós
podemos esperar as flores na época certa. Nós não precisamos de flores que têm
que ser trazidas diariamente da Tailândia. Custa uma fortuna, polui o ar. É uma
loucura."
O jornalista viajou a convite do
ITF.