30/10/2014 08:10 - O Estado de SP
EDITORIAL
A relação entre o Primeiro Comando da Capital (PCC) e as
vans que integram o serviço de ônibus da capital, que seriam usadas por ele
para lavar dinheiro obtido com o tráfico de drogas, está deixando de ser
simples suspeita. Agora é parte de denúncia feita à Justiça pelo Ministério
Público Estadual (MPE), por meio de seu Grupo Especial de Delitos Econômicos
(Gedec), contra duas pessoas – Geralda Jorge da Silva e Marcos Paulo Vidal de
Castro -, acusadas de terem movimentado R$ 1 milhão dentro daquele esquema
criminoso, entre 2004 e 2007.
A origem da denúncia, ainda não aceita pela Justiça, está
numa investigação baseada em escutas telefônicas, sobre o envolvimento de seis
pessoas - entre as quais aquelas duas - com o tráfico. Depois da prisão, em
2006, das duas agora denunciadas, o Gedec e a Polícia Civil identificaram
depósitos no valor de R$ 1.036.160,34 em duas contas - uma de Geralda Jorge da
Silva no Banco Itaú e outra de Marcos Paulo Vidal de Castro no Bradesco -
feitos naquele período.
De acordo com a denúncia, "os valores originários do
tráfico foram dissimulados por meio de investimentos feitos em vans, que
circulavam em linhas da Coopertranse no transporte coletivo alternativo,
especificamente na linha da Vila Ema". Esse era o nome da atual
Cooperpeople, que atua na zona leste. Silva confessou que trabalhava nela para
Castro. Os dois "se valiam de terceiros" para registrar os veículos
sem aparecer. Os "laranjas" foram identificados e seus nomes constam
da denúncia. Castro, segundo os promotores, foi um dos chefes do tráfico na
favela de Heliópolis, na zona sul.
O desfecho desse caso é da maior importância, porque ele
pode ajudar a desfazer a perigosa ligação do PCC com o serviço de ônibus, por
meio das vans. Para essa organização criminosa, trata-se de um excelente
negócio. O pagamento aos donos desses veículos, feito com base no que
arrecadam, pode chegar a R$ 1,2 mil por dia. Em média, eles ganham R$ 25,7 mil
por mês, de acordo com dados da São Paulo Transportes (SPTrans), que gerencia o
serviço de ônibus. Esses valores mostram que as vans podem mesmo, como pensa o
PCC, se transformar numa "lavanderia" de grande porte.
O PCC não perdeu tempo e não tem medido esforços para
explorar esse rico filão, como mostram investigações conduzidas pelo MPE e a
Polícia. Em março deste ano, durante diligência destinada a apurar se
integrantes do PCC estavam envolvidos em ataques a ônibus - que não por acaso
sempre pouparam as vans -, a Polícia deteve, para prestar esclarecimentos, 42
pessoas que participavam de uma reunião realizada na sede da cooperativa de
perueiros Transcooper, entre elas nove suspeitos de pertencer à organização.
Lá estava também o deputado estadual Luiz Moura, do PT.
Embora ele sempre tenha negado qualquer ligação, direta ou indireta, com o PCC,
o PT prudentemente excluiu-o de seus quadros, com isso impossibilitando sua
possível reeleição, a mesma prudência que não teve, diga-se de passagem, ao
acolhê-lo apesar de seu passado pouco recomendável. Moura foi condenado por
assalto a mão armada. Fugiu e, quando o crime prescreveu, pediu sua
reabilitação.
Empenho não falta ao PCC, como sempre acontece com o crime
organizado, para estabelecer boas relações com pessoas bem situadas.Em outra
operação, em julho, a Polícia prendeu mais de 40 pessoas ligadas ao PCC e
identificou duas que operavam para ele em Orlando, nos Estados Unidos, e no
Paraguai. Essas ações confirmam as conclusões de um estudo minucioso, feito durante
três anos pelo MPE, e divulgado em 2013, que mostra que o PCC vem crescendo
continuamente e já estendeu seus tentáculos à maioria dos Estados.
Estima-se que ele fatura R$ 120 milhões por ano, e o tráfico
de drogas se transformou em sua principal fonte de renda. O combate a essa
organização criminosa que atua dentro e fora dos presídios deve ser uma das
prioridades da política de segurança pública. E, nele, ocupa posição de
destaque o esforço para desmantelar sua rede de lavagem de dinheiro.