26/05/2014 09:10 - Valor Econômico
O sonho de muitos brasilienses do Plano Piloto é ver o metrô
construído nos anos 90 finalmente chegar à Asa Norte. E isso parecia ser
possível depois que a presidente Dilma Rousseff anunciou um pacote que garantia
R$ 630 milhões, em recursos a fundo perdido, para o projeto de ampliação da
linha. Mais de dois anos depois do anúncio, o governo local não fez sua parte:
concluir um projeto básico de engenharia para ter acesso às verbas e licitar as
obras.
Para frustração de quem saiu às ruas em protesto contra a má
qualidade dos serviços de transportes, em junho do ano passado, o caso de
Brasília não é exceção. Estados e municípios têm sido incapazes de sacar
recursos bilionários oferecidos pela União para investimentos em mobilidade
urbana. Até abril, segundo dados obtidos pela Lei de Acesso à Informação,
governadores e prefeitos conseguiram retirar apenas R$ 479 milhões dos R$ 12,4
bilhões a fundo perdido assegurados por Dilma para obras como metrôs e
corredores de ônibus.
O PAC da Mobilidade - Grandes Cidades, lançado em abril de
2012, previa investimentos totais de R$ 37,6 bilhões em 44 obras. As condições
do programa ajudavam a tirar do papel empreendimentos planejados até por
governos que enfrentam dificuldades nas contas públicas. Foram garantidos R$
12,4 bilhões em verbas federais sem necessidade de devolução e outros R$ 13,9
bilhões em financiamentos a taxas módicas, pela Caixa Econômica Federal ou pelo
BNDES, com até 30 anos para pagar e cinco de carência. Governadores e prefeitos
entrariam apenas com o dinheiro restante.
Para liberar os recursos, o governo central fez só uma exigência: a apresentação de projetos de engenharia até outubro de 2013. Diante do descumprimento de prazos, estendeu esse limite para o fim de dezembro, mas a maioria dos Estados e municípios ignorou a data. Um novo prazo foi dado: 30 de junho de 2014. Até agora, apenas 21 das 44 obras do programa tiveram financiamento contratado no Ministério das Cidades.
Autoridades desperdiçam verbas para mobilidade
No coração da República, enquanto um número cada vez maior
de carros entope até mesmo as avenidas largas da capital, o sonho de muitos
brasilienses que moram ou trabalham no Plano Piloto é ver o metrô construído
nos anos 1990 finalmente chegar à Asa Norte. Uma expansão da rede atual em 7,5
quilômetros e cinco novas estações, incluindo esse trecho da cidade, tinha tudo
para caminhar desde que a presidente Dilma Rousseff anunciou um pacote
bilionário de investimentos em mobilidade urbana.
A União garantiu R$ 630 milhões, em recursos a fundo
perdido, dos R$ 700 milhões necessários para ampliar o metrô no Distrito
Federal. Só que, mais de dois anos depois do anúncio feito pela presidente, o
governo local não fez sua parte: concluir um projeto básico de engenharia para
ter acesso às verbas e licitar as obras.
Para frustração de quem saiu às ruas em protesto contra a má
qualidade dos serviços de transportes, em junho do ano passado, o caso de
Brasília não é uma exceção. Estados e municípios têm sido incapazes de sacar
recursos bilionários oferecidos pela União para investimentos em mobilidade
urbana. Até abril, segundo dados obtidos pela Lei de Acesso à Informação,
governadores e prefeitos conseguiram retirar apenas R$ 479 milhões dos R$ 12,4
bilhões a fundo perdido assegurados por Dilma para obras como metrôs e
corredores de ônibus.
Esse desembolso pífio mostra a lentidão das autoridades em
dar uma resposta ao clamor das ruas e melhorar a oferta de transportes. Lançado
pela presidente em abril de 2012, antes mesmo das manifestações, o PAC
Mobilidade - Grandes Cidades previa investimentos totais de R$ 37,6 bilhões em
44 obras. As condições do programa ajudavam a tirar do papel empreendimentos
planejados até por governos que enfrentam dificuldades nas contas públicas.
Foram garantidos R$ 12,4 bilhões em verbas federais sem necessidade de
devolução e outros R$ 13,9 bilhões em financiamentos a taxas módicas, pela
Caixa Econômica Federal ou pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES), com até 30 anos para pagar e cinco de carência. Governadores e
prefeitos entrariam apenas com o dinheiro restante.
Para liberar os recursos, o governo Dilma fez só uma
exigência: a apresentação de projetos de engenharia até outubro de 2013. Diante
do descumprimento de prazos, estendeu esse limite para o fim de dezembro, mas a
maioria dos Estados e municípios ignorou a data. Um novo prazo foi dado: 30 de
junho de 2014. Até agora, apenas 21 das 44 obras do PAC Mobilidade - Grandes
Cidades tiveram financiamento contratado junto ao Ministério das Cidades.
Em algumas ocasiões, casos de empreendimentos bem-sucedidos
e travados convivem lado a lado. No Rio de Janeiro, o BRT Transbrasil e o
veículo leve sobre trilhos (VLT) do centro cumpriram todos os requisitos, mas a
linha 3 do metrô (São Gonçalo-Niterói) não consegue avançar. Em Brasília, o
projeto de um ônibus expresso que sai das cidades-satélites do Gama e de Santa
Maria para chegar em via exclusiva até o Plano Piloto já entrou em testes.
O diretor técnico do Metrô-DF, Luiz Gonzaga, justifica os
atrasos pela falta de planejamento nas últimas duas décadas. Sem grandes obras
de infraestrutura nos anos 80 e 90, segundo ele, houve forte desmobilização dos
escritórios de engenharia e hoje tornou-se complicado achar projetistas.
Para o diretor, a retomada dos investimentos encontrou esse
setor sem condições de atender adequadamente à nova demanda por projetos. Foi o
que ocorreu, na versão dele, com o metrô da capital. A Engevix foi contratada
pela estatal para fazer o projeto básico de expansão do sistema, mas ela não
entregou os trabalhos no ano passado e foi multada, afirma Gonzaga. Para não
atrasar ainda mais, houve "fatiamento" do projeto, que engloba as
estações no início da Asa Norte e nas cidades-satélite de Ceilândia e Samambaia.
Os trabalhos só serão concluídos na íntegra, entretanto, no fim do mês que vem.
A promessa do Metrô-DF é licitar os 7,5 quilômetros de
expansão da rede no segundo semestre, mas os últimos descumprimentos
desautorizam que se faça muita expectativa. Meses atrás, falava-se em iniciar
as obras em 2013. "Poderíamos entrar de peito aberto na construção. Mas,
sem um bom projeto, teríamos que parar tudo depois", diz Gonzaga.
Nem mesmo quando a iniciativa privada entra em cena os
projetos ficam livres de atrasos constrangedores. Em Goiânia, o governo
estadual licitou a construção e operação do VLT do Eixo Anhanguera, que corta a
cidade no sentido leste-oeste. O novo meio de transporte terá 14 quilômetros de
extensão, 12 estações e cinco terminais de integração.
A licitação da parceria público-privada (PPP) para o
projeto, no fim do ano passado, foi vencida pela Odebrecht TransPort e as
autoridades prometiam o início das obras para janeiro. Nada aconteceu. Em
março, quando o contrato finalmente ia ser assinado, a cerimônia foi cancelada
quando todos os convidados já estavam presentes na solenidade. O contrato
acabou sendo firmado no mês seguinte, mas as obras não começam antes de 2015,
segundo Carlos Maranhão, coordenador do VLT no governo de Goiás.
Faltam desapropriações em terrenos que somam 90 mil metros
quadrados, licenças ambientais e a estruturação de um fundo garantidor das
PPPs. Maranhão afirma que essas pendências devem consumir o restante do ano,
mas vê a obra como "irreversível".
O secretário nacional de transportes e mobilidade urbana do
Ministério das Cidades, Júlio Eduardo dos Santos, reconhece que a
"entressafra de projetos de engenharia" tem limitado a velocidade no
andamento do PAC.
Para atacar esse problema, ele diz que agora a prioridade do governo federal é financiar também a estruturação dos projetos e só negociar verbas para as obras em si quando tudo estiver pronto.
Discursos repetem promessas e críticas
Em outubro de 2011, a presidente Dilma Rousseff foi à cidade
que adotou como sua e anunciou apoio do governo federal para a construção da
primeira linha de metrô em Porto Alegre, com cerca de 15 quilômetros e custos
estimados em R$ 2,4 bilhões. Dois anos depois, em outubro de 2013, ela voltou à
capital e foi aplaudida ao fazer adaptações no anúncio anterior: o metrô ficou
menor (11,7 quilômetros) e sairá pelo dobro do preço (R$ 4,8 bilhões). Até
hoje, no entanto, a prefeitura não conseguiu lançar o edital de licitação do
empreendimento. E os gaúchos, na melhor das hipóteses, só terão o orgulho de
usar sua primeira linha subterrânea a partir de 2020.
Houve mudanças no método construtivo e quatro grupos
privados já se apresentaram para elaborar o anteprojeto do metrô, que deve ser
licitado como parceria público-privada (PPP) nos próximos meses, mas esse
vaivém demonstra como as obras de mobilidade urbana no país têm demorado anos para
dar passos mínimos. Ilustra ainda como, na falta de avanços mais concretos,
Dilma vem aproveitando solenidades oficiais para fazer repetidos anúncios de
investimentos que ainda não saíram da gaveta.
Ela já esteve em quatro cerimônias em Porto Alegre e outras
três em Curitiba, cercada de autoridades e com destaque nas mídias locais,
anunciando basicamente a mesma obra. Um traço comum em vários discursos nos
quais a presidente prometeu metrô nas grandes cidades são as críticas à falta
de investimento no passado e as amarras impostas pelo Fundo Monetário
Internacional (FMI) no orçamento público. "Dificilmente, no passado, o
governo federal fazia inversões nessa área. A partir do governo do presidente
Lula, logo depois que nós liquidamos as nossas posições de endividamento com o
Fundo Monetário e passamos a dirigir a nossa própria vida, nós começamos a
investir nos metrôs, que foram parcialmente feitos ao longo de mais de duas
décadas", disse Dilma quando anunciou pela primeira vez, em 2011, o metrô
de Porto Alegre.
Em outubro de 2013, quando anunciou uma nova equação
financeira para viabilizar a primeira linha de Curitiba, também fez referência
ao FMI ao dizer que "o Brasil, durante muito tempo, não tirou nada do
papel" por causa da falta de financiamento e das restrições no próprio
orçamento.
Na mesma semana, ao prometer investimentos da União na
expansão da rede de transportes em São Paulo, fez uma referência aos acordos
com o FMI nos anos 90 e deu uma alfinetada no governador Geraldo Alckmin
(PSDB). Ela lembrou a alegria de um funcionário do Ministério da Fazenda ao lhe
comunicar em 2005, quando chefiava a Casa Civil, autorização do FMI para
investimentos de R$ 500 milhões na área de saneamento. "Por isso é bom,
né, governador, a gente ter pagado a dívida com o Fundo Monetário, que não
supervisiona mais as nossas contas. Hoje nós podemos chegar aqui e anunciar uma
parceria que, no passado, era inconcebível", completou.
Nos discursos, Dilma tem insistido em que a falta de metrôs
no país ocorre não só por causa da incapacidade de investimentos, mas do
"complexo de vira-lata" das autoridades. "Havia, no Brasil,
determinadas concepções que consideravam que metrô era coisa de país rico. Como
nós não éramos um país rico, não podíamos investir em metrô e devíamos investir
em corredor de ônibus, só. Essa era a visão dominante no início dos anos
80", disse.
"Ao longo do tempo, se a gente olhar como planejaram o
desenvolvimento urbano no Brasil, vocês vão encontrar algo muito estranho, que
é um determinado desprezo pelo metrô. Porque se defendia que este era um país
pobre, devia investir em corredor de ônibus."