O preço do petróleo em queda traz perdas e ganhos

20/10/2014 07:35 - Valor Econômico

EDITORIAL

 Em menos de duas semanas, a cotação do petróleo tipo Brent desabou de pouco mais de US$ 100 por barril para a casa dos US$ 85, depois de ter ficado estável na faixa dos US$ 110 por quatro anos. Os especialistas atribuem essa queda à desaceleração da demanda global por causa do desaquecimento das economias europeias e da desaceleração acentuada da produção industrial chinesa. O mundo cresce pouco e, portanto, demanda menos combustível. Outra razão é que a produção nos Estados Unidos, o segundo maior comprador depois da China, aumentou.

É sempre bom ter cautela ao analisar o comportamento de mercados tão voláteis, como é o caso do petróleo. Mas, se o cenário que se desenhou nos últimos dias, de preço em torno de US$ 85, se mantiver por um período mais prolongado, o Brasil terá motivos para comemorar, mas também terá razões de sobra para se preocupar. A cotação atual do Brent torna pequena a defasagem entre os preços internos e externos da gasolina e do óleo diesel. Pelo preço internacional de sexta feira, o diesel no país ainda tem uma defasagem de 1%, mas a gasolina já está com um prêmio de 5% se comparada à da costa leste dos EUA.

A produção brasileira de gasolina e diesel não é suficiente para atender a demanda interna, que tem crescido em ritmo forte nos últimos anos e a Petrobras é obrigada a importar ambos os produtos. A estatal vem acumulando prejuízos por que vende internamente os derivados a preços inferiores aos que paga na importação. Estima-se que de 2011 para cá a empresa estatal tenha acumulado prejuízo de R$ 59 bilhões, valor que corresponde ao custo da política de congelamento de preços executada pelo governo Dilma Rousseff, financiada pelos acionistas da estatal, para conter a inflação.

A queda acentuada dos preços internacionais abre, para o governo, algumas oportunidades. Se os preços internos ficarem maiores do que os externos, o governo poderá manter a situação por algum tempo para que a Petrobras consiga recuperar o que perdeu, melhorando o caixa da empresa e sua capacidade de investimento.

Com a nova realidade do mercado do petróleo, o governo terá espaço também para definir uma regra para o reajuste dos preços internos dos combustíveis que deixe de penalizar a Petrobras. Uma regra de reajuste daqui para frente ajudaria a recuperar a credibilidade da gestão pública nesta área.

O governo poderá pensar, até mesmo, em uma pequena elevação dos preços internos da gasolina e do diesel, sem impacto considerável na inflação, para recuperar a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) incidente sobre os combustíveis, que está zerada desde 2012 - medida adotada também para evitar que o aumento dos derivados fosse repassado para o consumidor. Com a retomada da Cide-combustível, o caixa do Tesouro ganharia uma receita considerável, em um momento em que as contas públicas estão em visível desequilíbrio.

Há razões, porém, para preocupação. O plano de investimentos da Petrobras para o período de 2014-2018 foi elaborado com a perspectiva de um preço médio de US$ 105 para o barril de petróleo este ano, convergindo para US$ 100 até 2017. Pela projeção que baliza o plano de investimentos, só a partir de 2018 e até 2030 o barril de petróleo cederia para US$ 95. Com base nessas estimativas, a estatal calculou uma geração de caixa de R$ 182,2 bilhões ao longo dos cinco anos do plano.

Ao que tudo indica o preço médio não estará no patamar projetado pela Petrobras. Assim, a estatal terá que refazer o seu plano para o período 2014-2018, reduzindo os investimentos previstos inicialmente. Se decidir mantê-lo, terá que contrair mais empréstimos. Em junho, a dívida líquida da Petrobras estava em R$ 241 bilhões e equivalia a 3,94 vezes a geração de caixa medida pelo Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização), o que é considerado elevado. Outra alternativa seria realizar um novo aumento de capital da empresa.

A situação é ainda mais inquietante devido à atual regra da legislação que regulamenta os contratos de partilha de produção do pré-sal, que obriga a Petrobras a ter uma participação de no mínimo 30% no consórcio de cada nova área licitada. Essa regra sobrecarrega a estatal, colocando sérias dúvidas sobre a sua capacidade de levantar capital suficiente para realizar todas as operações.