Faixas para ônibus são invadidas até por caminhões

19/09/2014 08:00 - O Globo

RIO — Criadas para dar mais fluidez ao trânsito e reduzir o tempo de viagem dos transportes coletivos numa cidade cercada por canteiros de obras, as faixas exclusivas de ônibus, chamadas BRS, são palco de infrações que podem comprometer a filosofia do projeto. Em quatro dos principais BRSs — Presidente Vargas, Praia de Botafogo, Voluntários da Pátria e Nossa Senhora de Copacabana —, as irregularidade são muitas: carros particulares trafegam onde não podem e táxis param sem cerimônia para embarque e desembarque de passageiros. Além disso, caminhões fazem operações irregulares de carga e descarga. A cidade tem 15 BRSs, que somam 50,8 quilômetros.

A Guarda Municipal, agentes de trânsito da Secretaria municipal de Transportes e pardais ficam encarregados de fiscalizar as infrações. No ranking das multas aplicadas, por exemplo, pela Guarda Municipal em todas as faixas exclusivas da cidade — por invasão indevida por veículos não autorizados —, as quatro do Centro, inauguradas entre dezembro de 2011 e abril de 2012, foram as que mais registraram irregularidades até agora. Nos BRSs da Presidente Vargas, da Rio Branco, da Primeiro de Março e da Presidente Antônio Carlos, de janeiro a agosto deste ano, foram aplicadas 2.571 multas. Em todo o ano passado, nas mesmas vias, o número de infrações flagradas chegou a 433. Portanto, antes mesmo de 2014 ter acabado, o crescimento do número de multas já está em 493%.

Com apenas um ano de funcionamento, as faixas exclusivas do Estácio — na Rua Frei Caneca e na Avenida Henrique Valadares — são as que registram menos multas: até agora, foi apenas uma este ano. Em 2013, foram 19.

Este ano, de acordo com a Secretaria municipal de Transportes, até agora já foram aplicadas 3.120 multas por irregularidades cometidas nos BRSs, principalmente por táxis. Já a média mensal de multas emitidas por equipamentos eletrônicos por invasão da faixa exclusiva é de 2.692. Segundo a secretaria, apesar do número ainda elevado de infrações flagradas, houve redução na comparação com o ano passado, quando a média foi de 5.343 por mês.

— Os corredores estão bem, mas têm problemas, embora não afetem os objetivos do projeto. É difícil mudar o hábito do passageiro e do taxista de embarcar e desembarcar do lado direito. É uma minoria que ainda não respeita a regra, mas uma minoria significativa — reconheceu o secretário municipal de Transportes, Alexandre Sansão.

TAXISTAS INSISTEM EM DESRESPEITAR REGRAS

Para se ter uma ideia do problema, na manhã desta quinta-feira, no BRS da Voluntários da Pátria, em Botafogo, um guarda municipal multou 11 veículos (dez deles táxis) por irregularidades cometidas num trecho de apenas 50 metros em frente à Cobal.

— Eles sabem que não podem parar, mas insistem — observou um guarda municipal, que não se identificou, referindo-se a um taxista que parou no corredor, quase em frente a um ponto de ônibus, para o desembarque de uma passageira.

Também na manhã desta quinta-feira, uma equipe do GLOBO flagrou, na Praia de Botafogo, nada menos que 12 táxis parando indevidamente em frente ao Edifício Argentina e ao prédio da Fundação Getúlio Vargas (FGV), para embarque e desembarque, num período de 30 minutos, entre 8h30m e 9h. No mesmo período de tempo, sete taxistas sem passageiros trafegavam na faixa exclusiva, o que não é permitido. Além disso, cinco ônibus saíram da pista demarcada para fazer ultrapassagens, o que também é proibido.

— Um ponto funcionou aqui durante 12 anos e agora, por causa do corredor, somos obrigados a atravessar a rua para pegar um táxi do outro lado. Além de ser arriscado, em dias de chuva o transtorno é grande — reclamou uma funcionária da FGV, que se identificou apenas como Luciana.

Durante uma hora, apenas um taxista parou do lado esquerdo da pista para desembarcar um passageiro. Sem se identificar, outro motorista, que logo em seguida parou do lado direito para uma senhora desembarcar, argumentou:

— Os passageiros não gostam de desembarcar do lado esquerdo. E aqui na fundação há muitos funcionários idosos. É difícil convencê-los.

Na Nossa Senhora de Copacabana, primeiro BRS implantado na cidade, a infração mais comum é táxi trafegando no corredor sem passageiros. Um guarda chegou a multar um dos veículos, mas comentou que a prática de colocar película escura nos vidros dificulta a fiscalização:

— Eles se valem disso para trafegar pelo corredor. Sem ter certeza (de que não há um passageiro dentro do táxi), não posso multar. E, para multar todos, seria preciso um guarda em cada esquina, porque são muitos — disse um guarda.

Na Avenida Presidente Vargas, motoristas de ônibus também cometem abusos. É comum flagrar coletivos trafegando fora da faixa expressa, até porque lá o corredor costuma ser mais congestionado do que as outras pistas.

— O que dá raiva é que, para fugir do congestionamento, muitas vezes eles não param no ponto — reclamou a recepcionista Valéria Barros, que aguardava um ônibus num ponto próximo à Central do Brasil.

TEMPO DE VIAGEM CAI NAS FAIXAS EXCLUSIVAS

Mesmo com tantos obstáculos, trafegar no BRS ainda é mais rápido que fora dele. Segundo medições realizadas pela CET-Rio, a redução, em média, é de 25,58% no tempo de viagem no horário de pico, quando comparado à época em que o corredor não existia.

No BRS da São Clemente, por exemplo, esse número chega a 45,23%. Ou seja, a meta de 20% de redução no tempo do trajeto foi até superada — mas poderia ser melhor, não fossem os mal-educados.

— Estamos educando as pessoas, que devem pensar no bem coletivo. Em Botafogo, por exemplo, foi um desafio convencer as pessoas de que não poderiam mais parar na porta das escolas. As escolas buscaram soluções, nós oferecemos outras, e houve um consenso — disse o secretário Alexandre Sansão.

Os BRSs mais recentes a entrar em funcionamento foram os da Voluntários da Pátria, com três quilômetros de extensão, e da São Clemente, com 3,5 quilômetros. Cerca de 49% das 800 linhas do sistema municipal de ônibus passam hoje por algum trecho dos 15 BRSs em operação.

BRS: o total de multas aplicadas em cada região

Centro: Nos quatro BRSs do Centro (Presidente Vargas, Rio Branco, Primeiro de Março e Presidente Antônio Carlos) foram aplicadas este ano, até agosto, 2.571multas, enquanto em 2013 inteiro foram 433.

Copacabana: Foram emitidas 99 multas este ano nos BRSs (Barata Ribeiro, Princesa Isabel, Lauro Sodré, Raul Pompeia e Nossa Senhora da Copacabana). No ano passado, um total de 55.

Botafogo: Nos BRS do bairro (São Clemente, Voluntários da Pátria e Praia de Botafogo), são 714 multas até agora. As faixas exclusivas não existiam em 2013.

Ipanema/Leblon: Os corredores instalados nesses bairros (Ataulfo de Paiva, Visconde de Pirajá, Prudente de Morais, Vieira Souto, Delfim Moreira, General San Martin, Francisco Sá e Rainha Elizabeth) registraram este ano 52 multas (em 2013 foram 20).

Tijuca: Nos BRSs do bairro (inaugurados em agosto de 2013 nas ruas Doutor Satamini e Heitor Beltrão), foram aplicadas este ano 160 multas. Entre agosto e dezembro do ano passado, oito.

Vinte e Quatro de Maio: O corredor (inaugurado em novembro de 2013) acumula este ano 41 multas.