O sonho do trem entre Caxias e Bento Gonçalves

06/05/2013 05:39 - Zero Hora - Porto Alegre

A equipe do Labtrans, da Universidade Federal de Santa catarina (UFSC), que fez o trabalho de pesquisa, complementa a apresentação do estudo (06/05/2013) - Foto: Roni Rigon, Agência RBS

Defensores e entusiastas do transporte ferroviário de passageiros estão otimistas com a possibilidade de implantação do modelo entre Caxias do Sul e Bento Gonçalves. Um estudo de viabilidade bastante detalhado mostra, em mais de 500 páginas, que o trem tem condições de operar na região da Serra.

No projeto constam prováveis cenários, hipóteses, dados históricos, demográficos, aspectos econômicos, fatores climáticos e ambientais. Os detalhes poderão ser conhecidos na audiência pública que ocorre hoje, às 8h30min, na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul.

O custo total da obra deve chegar a R$ 350 milhões. Coordenador técnico do estudo, o engenheiro civil Rodolfo Carlos Nicolazzi Philippi, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), defende a implantação do trem baseado em três pontos:

- É um meio de transporte confiável, a pessoa sabe que vai tomar o trem no horário certo e chegar em seu destino com precisão. O componente ambiental também é fundamental, pois ele consome bem menos energia, assim, é menos poluente. E é muito seguro. O número de fatalidades, comparado com o transporte rodoviário, é baixíssimo.

O projeto é parte do Programa de Resgate do Transporte Ferroviário de Passageiros, integrante do Plano de Revitalização das Ferrovias do governo federal. O trem ligaria Caxias do Sul a Bento Gonçalves, passando por Farroupilha, Carlos Barbosa e Garibaldi, num percurso estimado em 59 quilômetros.

A operação seria da iniciativa privada, por meio de parcerias público-privadas ou concessões, com tarifas similares às do transporte rodoviário de passageiros. Assim, as rodovias poderiam ser desafogadas, ao menos em parte. O traçado da linha também não será o original de 1910, quando o trem ligou as cidades serranas.

- Com o trecho existente, seria o dobro de tempo. Procuramos alternativas para um traçado mais interessante. O estudo foi em cima das duas alternativas, mas a decisão é do Ministério dos Transportes - aponta Philippi.

Operação poderia iniciar em menos de cinco anos

Coordenador do programa de trens regionais de passageiros do Ministério dos Transportes, Euler Costa Sampaio, sustenta que o projeto é viável. Embora não tenha como prever quando o trem poderia estar em operação, uma vez que ainda há uma série de etapas, ele estima menos de cinco anos.

Coordenador da Comissão Especial do Trem Regional, o vice-prefeito de Caxias, Antonio Feldmann, espera que ao final da audiência pública o Ministério dos Transportes comece o encaminhamento para o edital de contratação do projeto executivo.

É ele que irá apontar, por exemplo, a alternativa de traçado definitiva, assim como custos. Os pontos que constam no estudo de viabilidade são apenas hipóteses. Para Feldmann, a implantação do trem traria impacto bastante significativo ao desenvolvimento da região.

DETALHES

A conclusão do estudo de viabilidade é apenas uma etapa. No próprio projeto constam os próximos passos:

- Pesquisa prévia para identificação de interesse

- Seleção dos trechos

- Estudos de viabilidade

- Audiências públicas

- Prospecção de interessados na delegação

- Definição do processo licitatório e editais

- Definição do ganhador

- Captação de financiamento

- Fabricação de trens e execução de obras de melhorias

- Efetivação do processo de delegação

Prefeitos reunidos

Na semana passada, o prefeito Alceu Barbosa Velho (PDT) e o vice, Antonio Feldmann (PMDB), coordenador da Comissão Especial do Trem Regional, receberam os prefeitos de Bento Gonçalves, Guilherme Pasin (PP), de Farroupilha, Claiton Gonçalves (PDT), de Garibaldi, Antonio Cettolin (PMDB), e de Carlos Barbosa, Antonio Xavier da Silva (PDT). Eles discutiram maneiras de aproveitar bem a audiência pública desta segunda-feira.

Traçado

- O estudo de viabilidade da UFSC conclui que a linha existente não apresenta boas condições geométricas horizontais. Como há muitas curvas, a velocidade média dos trens não passaria de 30 quilômetros por hora. Além disso, o traçado atual não liga diretamente Caxias e Bento: passa antes por Carlos Barbosa, aumentando o trajeto em cerca de 20 quilômetros. Assim, são apresentados dois traçados. O segundo é o mais indicado.

- Usar o traçado original, entre Caxias e Bento, passando por Farroupilha, Carlos Barbosa e Garibaldi, totalizando 62,52 km. O problema dessa opção, além da baixa velocidade, é que haveria a necessidade de construir 16 viadutos rodoviários e instalar 55 cancelas automáticas e 36 sinais sonoro-luminosos. Dos viadutos, 10 seriam na área urbana de Caxias. Assim, faltaria espaço físico, pois seriam necessárias 100 metros de rampa para cada lado dos viadutos.

- O estudo recomenda a implantação de duas linhas. Uma delas ligando Caxias a Bento, com passagem por Farroupilha e por uma estação de integração entre Garibaldi e Bento. A outra linha ligaria Barbosa à estação de integração, com passagem por Garibaldi. As extensões são de 48,88 quilômetros para a primeira linha e de 10,90 quilômetros para a segunda, totalizando 59,78 quilômetros.

Velocidade

- Na época em que o estudo de viabilidade foi concluído, há cerca de um ano e meio, os modelos fabricados no Brasil atingiam velocidade média de 80 quilômetros por hora e eram produzidos por uma única empresa. Hoje, segundo o coordenador técnico do estudo, Rodolfo Carlos Nicolazzi Philippi, há modelos fabricados no Brasil que atingem até 120 quilômetros por hora. O Ministério pede que se priorize tecnologia nacional. Porém, no caso da Serra, a velocidade deve se manter nos 80 quilômetros, em razão do traçado irregular, antecipa Euler Costa Sampaio.

Demanda de passageiros

- Segundo Euler Costa Sampaio, a demanda de passageiros estimada fica em torno de 9,5 mil por dia. Por ano, chegaria a 3,4 milhões. A demanda leva em conta a soma da transferência dos passageiros de ônibus e de veículos privados. O trecho mais ocupado seria entre Farroupilha e Caxias, com 5.618 passagerios/dia. Depois, viria Garibaldi e a estação de integração, com 3.988 passageiros/dia.

Custos

- O estudo aponta que o empreendimento completo custará em torno de R$ 5,5 milhões por quilômetro, totalizando R$ 350 milhões. Apesar do alto valor, o coordenador técnico do estudo defende que o preço não é muito diferente dos custos de uma rodovia.

– No caso da região Caxias-Bento, como ela é muito acidentada, a construção é difícil e cara – explica o Philippi.

Tarifas e tempo de viagem

- Pesquisa com usuários dos ônibus intermunicipais mostrou que eles deram maior importância à tarifa do que ao tempo de deslocamento. Outra pesquisa, com proprietários de veículos particulares, apontou como prioridade o tempo consumido no trem.

Portanto, o estudo conclui que a tarifa do trem deve ser semelhante ao do ônibus para estimular o uso. Os valores não estão atualizados, mas o estudo estipula que as tarifas variam entre R$ 6 e R$ 8. O tempo de viagem ficaria entre 1h10min, 1h35min e duas horas, nas modalidades direta, semidireta e paradoura. Entretanto, segundo Rodolfo Carlos Nicolazzi Philippi, os preços e tempos serão determinados quando houver projeto final de operação do serviço ferroviário.

Estações

- O estudo aponta as condições das estações existentes entre Caxias e Bento. Uma das estações de Caxias está preservada e hoje é ocupada pela Secretaria Municipal da Cultura. Outra estação, a 6,90 km da primeira e de porte bem menor, está semidestruída. Ainda em Caxias, a Estação de Forqueta precisa de serviços de conservação, como pintura e limpeza.

Em Farroupilha, há a estação de Nova Vicenza, que precisa de mudanças internas, e a Estação de Nova Sardenha, bastante precária. Em Carlos Barbosa, a antiga estação não poderá ser utilizada, pois está no Centro da cidade, sem possibilidade de acesso. Já a estação que opera a Maria Fumaça, em operação, está em boas condições. Em Garibaldi, há uma estação usada para transporte turístico. A estação de Bento também tem fins turísticos e apresenta boas condições. Em uma série de pontos os trilhos estão ocupados por pequenos comércios, residências e acessos a propriedades rurais, vegetação ou mesmo áreas alagadas.

Frota

- A frota recomendada pela UFSC é de quatro trens no trecho principal, de Caxias a Bento, nos primeiros anos de funcionamento. De Carlos Barbosa até a estação de integração (entre Garibaldi e Bento) serão três trens. Os dois sistemas possuirão dois trens como frota reserva e de manutenção programada.