04/10/2015 08:16 - O Globo
RIO - A cena é rotineira no sistema de transporte
intermunicipal do Rio. Num ponto da Avenida Brasil, em Guadalupe, as
aposentadas Aida Rabello, de 73 anos, e Raimunda Nonata Pedro, de 77 anos, após
39 minutos de espera, acenam para um ônibus. O motorista olha, depois finge não
ver as senhorinhas e segue em frente. A situação se repete em outras duas
tentativas, em diferentes pontos de embarque na mesma via expressa.
A revolta das duas poderia ser grande se não fosse por um
detalhe: as aposentadas são hoje voluntárias — junto a outros 10 idosos com
idades entre 65 e 84 anos — na fiscalização do Departamento de Transportes
Rodoviários (Detro). Elas atuam para identificar os (maus) motoristas que se
recusam a parar nos pontos.
A ideia da operação, batizada de "Velhinhos espiões’’ que
teve início em maio, surgiu após a ouvidoria do órgão receber uma série de
reclamações. Desde janeiro, foram registradas 500 queixas por recusa de
gratuidade a idosos (multa de R$ 2.400,87) e outras 1.115 referentes a
motoristas que não param nos pontos para atendê-los (multa de R$ 1.200,44).
Os "espiões’’ que não conseguem embarcar nos coletivos
sinalizam a irregularidade para um fiscal à paisana que, de carro, intercepta o
veículo num bloqueio mais à frente. Os motoristas são multados ali mesmo, e
recebem, na presença dos passageiros, uma boa "bronca” por terem desrespeitado
o direito dos idosos. Pelo Estatuto do Idoso, essa atitude é consideradas
crime, e a pena é de seis meses a um ano de detenção.
Desde maio, 13 operações foram feitas para checar
irregularidades denunciadas por idosos. Nesse tempo, 34 ônibus receberam multas
por se recusarem a transportá-los gratuitamente. E outros 14 foram autuados por
não pararem nos pontos para atender idosos.
BRONCA PÚBLICA
Na quarta-feira, fiscais interceptaram dois ônibus da Viação
Expresso que ignoraram os sinais das aposentadas Aida Rabello e Raimunda Nonata
Pedro na Avenida Brasil. O motorista José Fernando Moura, que conduzia a linha
Caxias-Itaguaí, tentou justificar a infração.
— Eu não vi as senhoras no ponto! Quer dizer: uma van que
estava no ponto me atrapalhou e eu tive que seguir com o carro para não
prejudicar o trânsito — disse ele. — Foi só dessa vez, não costumo fazer isso.
As desculpas não foram suficientes para evitar que fosse
multado e passasse pelo constrangimento de ser advertido na frente dos
passageiros.
No caso do segundo veículo, da linha Caxias-Campo Grande,
além de não encostar no ponto de onde as idosas acenavam, em Realengo, o
motorista se manteve a cerca de 90 km/h, sem fazer qualquer parada até Campo
Grande. A equipe de fiscalização do Detro, ao perder de vista o coletivo,
acessou um sistema de monitoramento dos transportes intermunicipais. Mas o GPS
do veículo havia sido desligado. Já em Campo Grande, o motorista José Conde
disse não ter parado porque não viu que se tratavam de idosos.
O Detro informou que continuará promovendo duas operações do
tipo por mês. Reclamações podem ser feitas pelo telefone 3883-4141 ou pelo
e-mail ouvidoria@detro.rj.gov.br.