Opção pela vida: dever de todo administrador público

30/05/2017 09:30 - ANTP

No Rio de Janeiro o número de multas de trânsito bateu recorde. A infração mais cometida pelos cariocas foi o excesso de velocidade, com quase metade dos registros. (Multas de radares batem recorde no Rio com 3 milhões de infrações em 2016 – O Globo)

Em São Paulo a imprudência no trânsito só tem feito aumentar o número de acidentes na capital, segundo registros tanto da Polícia Militar, quanto do Infosiga. (Dois acidentes em três dias deixam nove feridos nas marginais de SP – Folha de SP)

Em Salvador a Lei Seca puniu 35% condutores a mais nos quatro primeiros meses do ano em comparação a igual período de 2016. (Lei seca pune 35,5% condutores a mais este ano em Salvador – A Tarde)

Em pleno Maio Amarelo, mês dedicado à reflexão da sociedade sobre a necessidade de buscar um trânsito mais seguro, as notícias insistiram em trafegar na contramão das boas intenções.

Excesso de velocidade, dirigir sob o efeito do álcool, usar o celular junto com a direção, são infrações que muitas e ótimas campanhas insistem em alertar, mas, ao que parece, não têm surtido muito efeito sobre os infratores.

A fiscalização continua apartada da comunicação. Vista por muitos administradores como uma medida impopular, a multa tem sido tratada como vilã, ao invés de importante e necessária ferramenta de disciplinamento do trânsito.

Os adversários da fiscalização no trânsito, sob o absurdo argumento de que multas engordam os cofres públicos, jogam na conta do inevitável as mortes e sequelas causadas pelo excesso de velocidade, pelo uso do celular ao volante, pelo abuso do álcool.

Um exemplo disso é o Projeto de Lei (PL) 3340/2015, que tramita na Câmara Federal. Ele proíbe o uso de radares móveis na fiscalização de velocidade de veículos sob o surrado argumento de que é preciso coibir o uso desses equipamentos com “fins arrecadatórios” por órgãos estaduais e federais de trânsito. Na Justificativa do Projeto, o autor (deputado federal Goulart, do PSD de São Paulo) escreve: “Esta proposição tem como objetivo eliminar com uma pratica recorrente dos órgãos de trânsito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, a instalação de radar móvel, “armadilhas” destinadas a cumprir com o poder arrecadatório das autoridades de trânsito do País. Essa pratica enaltece a punição pecuniária em detrimento do caráter educativo.”

O alto custo do estrago que os infratores causa para as cidades e seus habitantes não é posto na ponta do lápis, nem levado em conta pelos críticos da “indústria da multa”.

Mas um estudo inédito do Centro de Pesquisa e Economia do Seguro (CPES), da Escola Nacional de Seguros, joga luz sobre este lado que muitos insistem em ignorar quando tratam os acidentes como efeitos colaterais...  O estudo estima que, só em 2016, o prejuízo com a violência no trânsito foi de R$ 146,8 bilhões, ou 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Esses números ainda são modestos, já que não levam em conta os gastos com hospital e fisioterapia.

Há uma indisfarçada leniência que contribui, compactua e até estimula para o aumento da criminalidade no trânsito. Há alguns meses um levantamento encomendado por uma das maiores companhias de concessões rodoviárias do país demonstrou que as tragédias provocadas por acidentes estão presentes na vida de 1 em cada 5 pessoas, que apresentaram histórico de mortes na família. O mesmo levantamento revelava a percepção das pessoas sobre o trânsito: 70% o percebem como perigoso.

Ano entra, ano sai, os números das tragédias continuam a crescer, e a sociedade curva-se aos argumentos dos egoístas: prefere menos fiscalização, nenhuma condenação, e torcem para que a próxima vítima não esteja em sua família, nem entre seus amigos.

Qualquer mudança comportamental jamais será popular, nem agradará a todos. Os descontentes, estes são mais barulhentos, e justamente os mais perigosos. A maioria, seja por desconhecimento, seja por conformismo, continua a ser o principal alvo de aumento das estatísticas da violência do trânsito.

Os gestores públicos têm de fazer uma escolha em prol da vida, por mais impopular que seja a opção por duras ações contra a irresponsabilidade ao volante de veículos de todo o tipo.

Salvar vidas deveria ser o primeiro objetivo de qualquer administrador público.